Como é bonito ver o Ilê Aiyê na Avenida Paulista

Cultura, afirmação e resistência embalam os passos e batuques do Ilê Aiyê, o primeiro bloco afro do Brasil que integra a 42ª Ocupação Itaú Cultural, em São Paulo, inaugurada na última quinta (4).

Criado em 1º de novembro de 1974, “O Mais belo dos belos” saiu do terreiro Ilê Axé Jitolu de Hilda Dias dos Santos (Salvador, 1923-2009), a Mãe Hilda Jitolu, ialorixá (sacerdotisa líder em iorubá), no bairro do Curuzu em Salvador direto para a avenida do maior carnaval de rua do mundo e somente com pessoas negras.

A existência do bloco representou mais que um desfile carnavalesco, era uma resposta a um tempo marcado pela exclusão de pessoas negras nos blocos de carnaval na Bahia, daí o preceito de apenas negros e negras serem associadas.

O lançamento da exposição contou com a presença de diversos artistas, intelectuais e ativistas do movimento negro, como a escritora Conceição Evaristo, a ativista e intelectual Érica Malunguinho e a cantora Xênia França, que foram prestigiar o momento. Para a filósofa Sueli Carneiro, o Ilê Aiyê é majestade absoluta para o povo negro. “É uma honra para a cidade de São Paulo receber a ocupação de um bloco afro que é da maior importância para todos os negros do Brasil, e é por isso que estamos aqui reverenciando”, disse à VICE. Com diversos recursos audiovisuais, a mostra conta também com tradução em Libras, a Língua Brasileira de Sinais.

Mãe Hilda e Vovô do Ilê. Foto: André Seiti/Divulgação

O nome Ilê Aiyê foi escolhido por Mãe Hilda, apesar de que Vovô, seu filho, queria “Poder Negro”, mas nada melhor que a anfitriã definir. “Quando eu falei pra mãe que ia sair no bloco, ela disse ‘eu também vou sair’, quando perguntei porque ela quis ir na frente do bloco ela disse: ‘É que se meu filho for preso, eu também vou’”, conta Vovô. Talvez Mãe Hilda já soubesse que o Ilê era muito mais que o bloco afro em estética e música. “Era o marco de uma revolução, era a afirmação de uma história, de uma raça”, diz Arany Santana, uma das diretoras do bloco.

Cultura e resistência

Representado na cor preta, o primeiro eixo da exposição retrata uma imersão histórica da raça negra e do bloco. A voz da cantora Luedji Luna abre os caminhos para o espectador passar por entre imagens do terreiro e rostos de moradores do Curuzu. Ao fundo, o barulho do mar se mistura ao som de importantes nomes da luta contra o racismo.

Nascida e criada no bairro, hoje Val Benvindo é produtora do bloco e foi uma das conselheiras editorial da exposição. Ela conta da importância da ocupação do Ilê acontecer na Avenida Paulista. “Depois de todo processo de construção da ocupação, chegar ao dia de hoje nesse espaço tão elitista e com o nome de Ocupação, não haveria nome melhor, pois a gente está ocupando mesmo. Ocupando com a nossa história, nossa essência, mostrando, os nossos 44 anos de resistência”, explica.

Associados do bloco Ilê Aiyê em trajes de carnavais anteriores. Foto: André Seiti/Divulgação

O Mais Belo dos Belos

Na cor vermelha, o segundo eixo evidencia o Carnaval e suas cores e crenças. Chamado O Mais Belo dos Belos, o momento registra não somente a força histórica do terreiro de Candomblé, da religião e da cultura negra, mas toda a beleza do desfile do bloco. Na mostra, o espectador é apresentado aos primeiros tecidos das fantasias, com manequins inspirados em Abayomis (bonecas negras em tecido e amarrações); além de croquis históricos.

Noite da Beleza Negra é o grande foco do terceiro eixo, que na cor amarelo ouro, traz a riqueza da cultura e estética negra. O famoso concurso do bloco elege anualmente a Deusa do Ébano, mulher da comunidade do Curuzu que assume o reinado do carnaval negro. De Mirinha Cruz, a primeira Deusa do Ébano eleita em 1976, até a jovem Jéssica Nascimento, rainha de 2018, a exposição dos 44 carnavais repletos de resistência e exaltação da cultura e identidade afro-brasileira.

No quarto e último eixo da ocupação, a cor branca impera. Simbolizando o branco de paz, da cura, além de fazer referência à música Negrume da Noite. Com interatividade e projeções, os instrumentos e toda a sonoridade do bloco ganham destaque, incluindo os discos, disponíveis para audição.

Banda Aiyê. Foto: André Seiti/Divulgação

O espaço também apresenta as ações socioeducativas do bloco para além do Carnaval, a exemplo da Band’Erê, composta por jovens que ao final da formação passam a integrar o grupo adulto. A Escola da Mãe Hilda e os Cadernos de Educação, produzidos desde 1995, são outros exemplos das ações políticas e sociais do Ilê Aiyê. O rico material é fruto do Projeto de Extensão Pedagógica do bloco e utilizados nas escolas públicas da comunidade.

Cria do Ilê Aiyê, Val Benvindo faz o convite: “Nossa história está aí, pra quem quiser vir, para as escolas realizarem visitas. A gente poder vir pra São Paulo e saber que tem um pedaço do Curuzu no meio da Avenida Paulista é mais que gratificante”.

A Ocupação Ilê Aiyê permanece no Itaú Cultural (térreo) até dia 06 de janeiro de 2019, de terça a sexta, das 9h às 20h; e aos sábados, domingos e feriados, às 20h.

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