Como as telefônicas querem aprisionar internet

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Às vésperas da votação do Marco Civil, cresce pressão para quebrar neutralidade da rede. Implicaria discriminar conteúdos segundo capacidade financeira de quem os produz.

Por Jonas Valente.*

O projeto de lei (PL), que prevê a criação do Marco Civil da Internet (2.126/2011), foi apresentado pelo governo federal como umas das principais respostas às denúncias de que o governo dos Estados Unidos teria montado um esquema de espionagem que incluiria a interceptação de dados em diversos países, inclusive no Brasil.

No entanto, a disputa em torno do PL do Marco Civil vai além das questões de espionagem. O lobby das empresas de telecomunicações – que são, inclusive, acusadas de participar do esquema de monitoramento do governo americano – pretende acabar com o modelo de Internet historicamente constituído e consolidado, sobretudo, nos acessos fixos.

Internet livre, neste caso, significa que os usuários têm direito a contratar o serviço, podendo navegar à vontade na velocidade que escolheram, sem nenhum tipo de interferência ou limitador. Essa garantia ficou conhecida como “neutralidade de rede”. Ou seja, a rede não deve dar tratamento diferenciado a ninguém.

Fazendo um paralelo com uma estrada, a operadora estaria proibida de cobrar pedágio de uns e não de outros. Pois é exatamente o que propõem as empresas de telecomunicações. Elas querem ter total controle sobre o tipo de conteúdo que trafega na Internet. Isso atenta contra uma característica fundamental da rede, coloca o poder de escolha do acesso nas mãos das operadoras e traz dois tipos de prejuízos.

O primeiro é mais direto para o usuário. Seriam criadas “classes” de clientes conforme um volume de dados, não pela velocidade. Quem usar mais (para baixar músicas, vídeos) paga mais. Os pacotes mais baratos (e mais acessíveis à grande maioria dos internautas) teriam poucos aplicativos, e-mails e acesso a sites, entre outras coisas. Seria como fazer da Internet uma TV a Cabo, você conseguiria acessar o que o seu poder aquisitivo permitir.

Além disso, a criação de “franquias de dados” poderia fazer com que as empresas de infraestrutura segurassem investimentos. Quando a rede estiver saturada, a velocidade cai. Esse modelo freia o desenvolvimento do país. Em um cenário no qual a empresa tem que assegurar o tráfego em uma velocidade contratada, sem limite de dados, ela precisa ampliar a rede para poder vender mais pacotes. Isso evita o risco de “apagões” e melhora a qualidade do serviço.

Essa mudança patrocinada pelas operadoras feriria o princípio de que o direito de escolha do que acessar é do usuário. Poderia, ainda, trazer aumento do preço dos pacotes com mais capacidade de uso. O Brasil iria na contramão do mundo, que caminha para assegurar um acesso na web cada vez maior e com mais velocidade.

O segundo prejuízo é para a democracia. As operadoras poderiam discriminar os sites, facilitando a visualização de uns em detrimento de outros. Com isso, os grandes conglomerados de mídia, que tivessem dinheiro para fazer acordos com as empresas de telecomunicação, teriam acesso “facilitado”. Por exemplo: a pessoa preferiria acessar o portal Terra, e não um blog, porque o primeiro demoraria menos tempo para baixar. Ou optaria pelo Gmail, e não por um provedor local, porque o primeiro seria mais rápido.

As empresas de telecomunicação pressionam agora o governo e os parlamentares para incluir a franquia de dados no artigo 9º do substitutivo do deputado Alessandro Molon (PT-RJ), relator da matéria. Querem colocar uma garantia de mercado em algo que deveria ser a carta de princípios da Internet no país. Com o modelo de negócios, ameaçam a Internet em um de seus pilares mais fundamentais. E avançam sobre o controle da rede, o que, como as denúncias de Edward Snowden já mostraram, abre espaço para a invasão da privacidade dos usuários.

Enquanto isso, a campanha ‘Banda Larga é um Direito Seu’ cobra do governo, do relator e de deputados a necessidade de assegurar a neutralidade de rede no texto que vai à votação. Uma luta difícil e que precisa do apoio de quem quer continuar a acessar a Rede Mundial de Computadores sem ter que pagar pedágios (visíveis ou não).

Quer saber como começar? Divulgue que a nossa Internet está em risco. E cobre do seu parlamentar o apoio ao Marco Civil com a neutralidade de rede.

* Jonas Valente -em Carta Capital- é membro do Conselho Diretor do Intervozes e mestre em Comunicação Social.

Fonte: Outras Palavras -Outras mídias

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