Como as desigualdades sociais interferem na saúde das pessoas em plena pandemia de covid-19

Foto: Pixabay

Por Douglas F. Kovaleski para Desacato. info.

No texto dessa semana irei abordar o tema das desigualdades em saúde e como isso afeta na saúde das pessoas no que se refere à pandemia de covid-19. É sabido que aos mais pobres resta uma maior dificuldade de manter o isolamento social, maior risco de perda do emprego e renda, há uma marcada dificuldade de acesso aos serviços de saúde. Nas camadas mais pauperizadas da população o saneamento básico também é mais escasso e a habitação precária, onde muitas pessoas precisam dividir um mesmo espaço, impedem que qualquer medida de isolamento entre as pessoas seja eficaz.

Diante das abissais desigualdades de renda e de acesso a serviços de saúde no Brasil, não faltam motivos para esperar um efeito desproporcional da COVID-19 entre os mais vulneráveis. A mortalidade por doenças do aparelho respiratório aumentou de forma preocupante em todo o Brasil entre os anos 2000 e 2013. A Pesquisa Nacional de Saúde de 2013 indica que entre os 20% mais pobres da população, 94,4% não têm plano de saúde e 10,9% se autoavaliam com saúde regular, ruim ou muito ruim, mas não consultaram um médico no último ano. Entre os 20% mais ricos, esses índices são de apenas 35,7% e 2,2%, respectivamente. Quanto ao número disponível de leitos de UTI é cinco vezes inferior para os usuários exclusivos do SUS (1,04 leito por 10 mil habitantes, sendo bem menos em estados do Norte e Nordeste) do que para os beneficiários da rede privada (4,84 leitos por 10 mil habitantes), isso de acordo com os dados do DATASUS.

A Pesquisa Nacional de Saúde (2013), estima que 42% de brasileiros se enquadra no grupo de risco para o COVID-19. Se considerarmos como fatores de risco ter acima de 60 anos, ter sido diagnosticado com diabetes, hipertensão arterial, asma, doença pulmonar, doença cardíaca ou doenças cardiovasculares, doenças crônicas pulmonares, hipertensão, doenças crônicas renais, imunodeficiência e doenças neurológicas.

Há que se considerar, entretanto, que os fatores de risco não estão distribuídos igualmente na população. Principalmente quando se percebe, afastando-se de um referencial biomédico, que 79% das pessoas com um ou mais fatores de risco, declararam ter frequentado apenas o ensino fundamental, ante 28% para os que frequentaram o ensino médio e 34% para os que chegaram a cursar o ensino superior ou pós-graduação. Esta diferença é ainda maior quando se considera quem tem mais de um fator de risco, sendo a presença de dois ou mais fatores de risco três vezes maior entre aqueles que frequentaram apenas o ensino fundamental do que entre aqueles que frequentaram o ensino médio.

A preocupação desse texto é evidenciar a importância das desigualdades sociais na incidência de covid-19 e alertar a sociedade que para frear a pandemia seja com ou sem vacina, seja com ou sem um medicamento eficaz contra a covid-19, são necessárias medidas mais intensas para as populações vulneradas (aquelas que o capital tornou vulneráveis). Não basta dedicar esforços maiores para evitar a contaminação de idosos; só será possível conter a pandemia, evitando o colapso do sistema de saúde e a progressão acelerada do número de óbitos, se as medidas governamentais forem destinadas a proteger os mais pobres por meio de políticas de renda mínima, possibilitando o isolamento social, pela ampliação do número de leitos no SUS e pela fila única para leitos hospitalares, afinal não podemos admitir que algumas vidas importem mais que outras.

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Douglas Francisco Kovaleski é professor da Universidade Federal de Santa Catarina na área de Saúde Coletiva e militante dos movimentos sociais.

A opinião do/a autor/a não necessariamente representa a opinião de Desacato.info.

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