Camila Vallejo: o rosto e a voz da nova geração política chilena

Opera Mundi.

Ela nasceu num Chile que exigia mudanças, cinco meses antes do plebiscito (abril de 1988) que marcou o fim da ditadura de Augusto Pinochet (1973-1990). Aos 23 anos, a estudante universitária diz sentir que sua geração desperta politicamente sem crer que a atual democracia representa os interesses da maioria. E, em busca de um modelo mais amplo e representativo, a futura geógrafa – lembrada pelo caminhar cheio de certezas e a já conhecida argola no nariz – delineia as coordenadas do primeiro movimento político formado por chilenos que eram jovens demais nos anos de repressão.

Camila Vallejo Dowling, filha de Reinaldo Vallejo e Mariela Dowling – membros do Partido Comunista perseguidos na ditadura –, se destaca como uma das principais líderes da CONFECH (Confederação dos Estudantes do Chile), órgão recém criado para congregar as diversas federações estudantis responsáveis pela chamada “primavera estudantil chilena” e quer alimentar um movimento social que, segundo ela, já ultrapassou o âmbito meramente educacional.

Após realizar três megamanifestações em frente ao Palácio de La Moneda – a maioria com mais de 150 mil pessoas em Santiago – Camila se tornou a primeira figura política de destaque nacional de uma geração que era considerada apolítica e desinteressada, qualificações rejeitadas por ela. “A ditadura gerou um grande contingente de jovens apolíticos, educado através do medo, mas os que se manifestam hoje são outros. Após aquela geração, surgiu uma juventude muito forte, ainda que inexperiente. Ela é mais crítica e quer recuperar a política com ideias mais amplas; quer outra democracia”, afirma a militante, dona de um olhar reto, direto, frequentemente confundido com braveza.

Camila preside a FECH (Federação dos Estudantes da Universidad de Chile). Quando os estudantes de diferentes federações estudantis reuniram sua indignação e criaram a CONFECH, em maio deste ano, ela rapidamente se impôs como porta-voz e foi o rosto das primeiras marchas e manifestações realizadas pelo movimento, que combate o lucro nas instituições educacionais chilenas e pede o retorno da educação pública gratuita e de qualidade. Isso porque, no Chile, escolas e universidades chamadas públicas cobram mensalidades.

Uma “primavera” que floresceu num dos outonos mais frios do país nos últimos anos. A temperatura já flertava com os graus negativos no começo do mês de maio quando o atraso nas bolsas de estudos concedidas pelo Ministério da Educação terminou com a paciência de milhares de pais e estudantes ao longo do país.

Foi quando Camila e a CONFECH se tornaram protagonistas e os estudantes incrementaram as marchas e protestos bem humorados, com “beijaços” e coreografias em grupos. Eventos que conseguiram derrubar o ministro Joaquín Lavín e contribuíram para a queda da popularidade do presidente Sebastián Piñera, além de mudar a percepção da sociedade sobre a politização dos jovens no país. Segundo o Servel (Serviço Eleitoral do Chile), o número de inscritos para as eleições dentro da faixa etária entre 20 e 30 anos variou negativamente nos últimos cinco anos.

No entanto, os que se manifestam não encontram espaço na política devido ao sistema eleitoral — binominal –, que favorece a continuidade e dificulta a renovação geracional.  Para Camila, os governantes chilenos têm facilidade para corromper a democracia real, “mas os novos espaços de participação popular estão sendo criados, nas redes sociais, por exemplo, e no fim, essa geração que está criando espaços vai fazer com que as barreiras geracionais acabem sendo derrubadas pelo próprio peso.”

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Machismo

Após os primeiros atos, os meios de comunicação apontaram os holofotes sobre Camila, mas frequentemente destacando sua beleza física, em detrimento das qualidades intelectuais. “Tive de aguentar coisas que colegas homens jamais tiveram de enfrentar”, diz, para depois destacar que o impacto do movimento na sociedade relegou esse rótulo machista sobre as mulheres a um segundo plano: “Vejo isso com bons olhos”.

Ela comemora também a possibilidade de um maior intercâmbio político entre estudantes da região sul-americana. “Na medida em que os países fortalecerem a unidade regional, os movimentos estudantis também o farão. Pretendemos comparecer ao CLAE (Congresso Latinoamericano e Caribenho de Estudantes)”.

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Camila é militante do Partido Comunista, mas destaca que a confederação que representa agrega estudantes de diferentes vertentes políticas e que a disposição por mudanças no país é equivalente entre todos. “O nefasto desempenho das políticas educacionais da Concertação, que defendeu o modelo instaurado por Pinochet, ajudou a nossa causa a unir forças, e agora, com a direita de volta ao poder, querendo reforçar a privatização do sistema e o lucro das instuições, ficou mais fácil reunir pessoas insatisfeitas”, analisa.

Em um congresso estudantil realizado em Punta Arenas, no extremo sul do Chile, Camila e a CONFECH começaram a confeccionar o que denominaram “um Grande Acordo Social para a Educação”, em clara resposta ao GANE (Grande Acordo Nacional para a Educação) lançado há duas semanas por Piñera e recusado pelos estudantes. Segundo eles, ele legaliza o lucro e aprofunda o atual modelo de educação. “Pretendemos levar essas propostas ao Executivo e ao Legislativo. Vamos batalhar para que elas sejam aceitas nessas instâncias. Para isso também contamos com o apoio já observado pelos trabalhadores e pela sociedade em geral”, finalizou Camila.

Imagem: Cooperativa.cl

 

2 COMENTÁRIOS

  1. Chile isn’t in repression…her father is in the comunist party for 18 years…comunism is a very very small party…for 20 years Chile had president elect and from the concertacio (that is comunism…socialist…christian democratics …)she has been brain washed for her parents… her father said in a news paper…”she is pretty and that help”you need to investigated first…

  2. Primavera.

    Não entendo de que Primavera falam.
    O Chile está no quinto presidente eleito pelo voto do povo. Quatro foram de la Concertación. Houve alguma manifestação nesse tempo contra os governos eleitos?
    Como criar um fato para que a polícia haja e aí chamar isso de repressão, como se o Chile vivesse na ditadura? A Educação que serviu desde 1990 em 2010 não serve mais? E outra, não foi a maioria que escolheu Piñera? Como dizer que essa democracia é de uma minoria. A esquerda nunca aprende. Se perde, quer ganhar no tapetão.

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