Cadê o manifesto dos intelectuais contra Belo Monte?


 

Por Fausto Brignol.

 

Onde está o manifesto dos intelectuais contra Belo Monte? Explico melhor: o manifesto dos intelectuais, ou a adesão dos intelectuais ao movimento que corre o Brasil a partir do Pará.

 

É claro que os intelectuais paraenses já devem ter feito o seu manifesto contra Belo Monte. Mais que isso, devem estar na primeira linha no combate contra a horrenda devastação e mortandade que está por acontecer ali no Xingu. Intelectual que se preza não foge da raia, não se esconde embaixo da cama, não banca o alienado. Intelectual de verdade pega o fuzil e vai pras primeiras fileiras, onde o chumbo é mais grosso.

 

Por isto estou esperando o manifesto dos intelectuais – os que não são paraenses – contra a construção da hidrelétrica de Belo Monte. Já deveria ter acontecido, mas vocês sabem como é intelectual… Às vezes é necessário um empurrãozinho para que funcione. Ficam tão preocupados com as suas idéias geniais e com o próprio umbigo onde essas idéias circulam, ininterruptamente, que esquecem do mundo que os cerca.

 

São estranhos os intelectuais. Formam uma classe à parte. Ou melhor, uma classe acima. Acima das demais classes sociais. Porque a classe dos intelectuais, como nos acostumamos a chamá-los, não pertence, necessariamente, a nenhuma classe social. O seu privilegiado intelecto não permite. Estão acima de todos. Embora eu não conheça intelectual pobre. Você conhece? Eu não conheço. Mas deve haver. Agora mesmo eu lembro de dois: Mario Quintana e Cora Coralina. Mas são raridades.

 

Hoje em dia, intelectual que não pertence a uma família rica, dá um jeito de aproximar-se do poder político. Acaba ganhando um ministério, secretaria ou cargo de confiança. É claro que terá a obrigação de nunca contrariar os seus empregadores. Nas décadas de setenta e oitenta, falava-se muito contra os intelectuais orgânicos que viviam à volta do poder. Hoje, os mesmos que criticavam aqueles fazem listinhas apoiando candidatos que lhes darão empregos bem remunerados. E seu nome é legião.

 

Mas, por uma questão de coerência consigo mesmos, sempre preservam o intelecto, acima de tudo e de todos.

 

Intelectuais são pessoas famosas. Fazem música, teatro, escrevem poesias, contos, crônicas, novelas, romances, são pintores, escultores… A arte é a sua vida. Embora muitas vezes não pareça, também são humanos. Gente como a gente. Por isso, quando em época de eleições, apóiam os seus candidatos, fazem manifestos a favor ou contra determinadas posições políticas – revelam a sua pureza.

 

Daí a minha surpresa em ainda não ter saído o Manifesto dos Intelectuais Contra a Construção da Hidrelétrica de Belo Monte. Pode ser esse título ou outro parecido, mas desde que seja contra Belo Monte. Todos sabem que a construção de Belo Monte é uma perversidade e um atentado contra a natureza. Por que será que os intelectuais ainda não lançaram o seu manifesto de repúdio?

 

Será que estão todos empregados no governo? Ou tão estreitamente ligados ao PT que concordam de cabeça baixa com qualquer coisa que o governo fizer, mesmo que seja a mais horrenda das ações?

 

Alguns dão explicações. O físico Rogério Leite escreveu um artigo dizendo que Belo Monte deve ser construída, porque seria o sacrifício de “apenas” 500 mil metros quadrados de mata, sendo que a cada dois dias os mesmos 500 mil metros quadrados são devastados na Amazônia e o governo deixa acontecer. O fato de o governo deixar acontecer não é novidade. Este é um governo que quer ganhar dinheiro e desmatamento dá dinheiro. Mas o físico está errado: não é a cada dois dias, mas a cada 26 dias. E Belo Monte não será apenas mais um desmatamento e alagamento de 500 mil metros quadrados de floresta. O impacto ambiental será milhares de vezes superior a isso. Afetará toda a Amazônia. Desconfio que esse senhor esteja vinculado ao governo. Por outro lado, é um físico e os físicos não são de todo confiáveis. Vira e mexe, eles estão construindo armas devastadoras. Seres que não tem respeito à natureza.

 

Não estou dizendo que todos sejam omissos ao que está acontecendo no Xingu. Existem vários grupos, sites, blogs, de pessoas reconhecidamente intelectuais, que estão lutando contra a construção de Belo Monte. No Brasil, nem todo intelectual é necessariamente um doutrinado petista ou um esfuziante dilmista. Vejam Leonardo Boff, que assinou o manifesto dos intelectuais a favor da eleição de Dilma. Escreveu um artigo intitulado: “BELO MONTE: A VOLTA DA DITADURA MILITAR?”. Só não lembro se esse artigo foi escrito antes ou depois do seu apoio à Dilma. Parece-me que foi antes.

 

Mas cadê o manifesto dos intelectuais contra a usina de Belo Monte?

 

Dizem que vivemos uma democracia, porque podemos votar, mesmo que naquela estranha urna, mas é democracia um sistema onde o povo pode muito menos que o governo? Onde pessoas são jogadas de um canto para o outro, suas terras são tomadas, transformadas em um imenso canteiro de obras e depois inundadas para gerar dinheiro para o governo que não é o povo?

 

Estranho Brasil, estranha democracia que trata os indígenas como seres inferiores e as plantas e animais como objetos descartáveis…

 

E o Congresso mudo. O que podemos esperar de um Congresso tão tiririca? É mudo, mas não amordaçado. Já se foi o tempo em que a desculpa para a mudez do Congresso seria a mordaça ditatorial, quando era apenas medo. Hoje, o único medo deles é perder o dinheiro fácil.

 

O Judiciário? O que esperar de um Judiciário de extrema-direita que tem os membros eleitos pelos outros dois poderes?

 

Resta o povo. E, entre o povo estão os autodenominados intelectuais. ‘Entre o povo’ é força de expressão – a uma larguíssima distância do povo. E os intelectuais – com as exceções de sempre – são aqueles seres orgânicos do governo que, ao se omitirem em questões cruciais para o país – como esta de Belo Monte – serão lembrados apenas como vermes e sanguessugas da máquina estatal.

 

Já assisti a um vídeo, no YouTube, intitulado “BELO MONTE = CRIME AMBIENTAL”, em que a música de fundo é “Gota D’água”, do Chico Buarque. Mas do Chico só isso.

 

Cadê o Chico? Será que ainda está viajando para colher idéias para novos livros? E os outros tantos intelectuais famosos que escreveram aquele manifesto a favor da Dilma, será que estão viajando em outras esferas?

 

Ou muito preocupados com os seus próprios afazeres, muito, muito, mas muuuuito pessoais?

 

Cadê o manifesto dos intelectuais contra Belo Monte?

 

Imagem: ehelpcarolina.com

1 COMENTÁRIO

  1. Talvez, por pensar, ninguem se manifesta.
    Já disseram que o Brasil ainda vai virar um imenso Portugal. Acho que, há mais de 500 anos, quando saiu-se procurando ouro, descobriu-se uma saída.
    Podia-se não ser uma solução,mas, era uma saída.
    O grande problema das economias é a energia.
    O ouro tirado das novas terras já revolucionou o mundo.
    Construir uma usina em Belo Monte pode ser como “matar vários coelhos, com uma única cajadada”.
    Os nativos sobreviventes seriam, finalmente, exterminados.
    Com a produção de energia poderiam garantir o futuro.
    ‘O RESTO é coisa do passado’…

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