Brumadinho, por quem as sirenes não dobram

Foto: Aakash Sethi/Pexels

Por Míriam Santini de Abreu.

Pelo andar da carruagem, não vai dar em nada a punição pelo crime de Brumadinho. É estarrecedora a afirmação do presidente da mineradora Vale, Fábio Schvartsman, de que as sirenes que deveriam alertar sobre o rompimento da barragem não soaram porque foram atingidas de forma rápida pela lama antes que pudessem disparar o alarme. “Em geral, pelo que o histórico de rompimento de barragem demonstra, em geral isso acontece aos poucos, e aqui aconteceu um fato que não é usual, houve um rompimento muito rápido da barragem e o problema da sirene é que a sirene que iria tocar foi engolfada pela queda da barragem antes que ela pudesse tocar”, disse o executivo. A Folha revelou que a empresa, em seu plano de segurança, previu a inundação do refeitório e da sede da barragem, mas desprezou o risco.

Ou seja, nem ao menos um aviso do horror que se aproximava foi dado para alertar as comunidades, porque os funcionários que almoçavam no horário do rompimento da barragem não tiveram a menor chance. Um escárnio corporativo. Lembra o vazamento tóxico de uma fábrica da Union Carbide que espalhou gás em uma grande área residencial em Bhopal, na Índia. Passaram-se 30 anos e a justiça está longe de ser feita.
 
Em um belo e triste livro-reportagem, “Meia noite em Bhopal”, Dominique Lapierre e Javier Moro mostram como tudo apontava para a possibilidade de vazamento. Era certo. Mas nada foi feito. A população dormia – era perto da meia-noite – quando a nuvem tóxica tomou parte da cidade, a parte mais pobre, matando 8 mil pessoas. A sirene de segurança, que deveria alertar em casos de acidente, era a mesma usada em troca de turnos – o que confundiu a população – e soou bem depois do vazamento. Calcula-se que mais de 150 mil sofreram sequelas e contraíram doenças como câncer, cegueira, danos no fígado e nos rins após a contaminação. A empresa até então se recusava a revelar o que continha o gás letal (isocianato de metila, usado para fabricar agrotóxicos) e como era possível minimizar os danos em caso de vazamento. Soube-se depois que teria bastado emergencialmente colocar um pano molhado sobre o nariz e a boca.
 
Nenhum funcionário de primeiro nível da Union Carbide foi julgado sobre o que aconteceu em Bhopal.
 
Bhopal, Brumadinho… As sirenes do capitalismo não dobram, como há séculos fazem os sinos naquelas minas gerais. Importa é cavoucar a terra e exportar o minério.
[avatar user=”Miriam Santini de Abreu” size=”thumbnail” align=”left” /]Míriam Santini de Abreu é jornalista em Florianópolis.

DEIXE UMA RESPOSTA

Please enter your comment!
Please enter your name here

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.