Bate-papo sobre a Conjuntura Municipal de Florianópolis

Por Loureci Ribeiro.

Olá Elaine Tavares,

parabéns pela oportuna  iniciativa de abrir este debate sério, estratégico e urgente de avaliação da conjuntura municipal, no contexto das eleições e para alem delas, como ficaram claro na linha final de seu texto: Florianópolis: uma cidade a se ganhar” .

É exatamente nestas interfaces que reside minha indignação com tudo isso, que segue ha mais de 16 anos, na conjuntura política de Florianópolis, mas também é aí nestas interfaces que residem minhas esperanças. Faz uns 30 dias que estou, de quando em vez, discutindo de forma isolada com companheiros, nos intervalos de reuniões e ações de movimentos e lutas, entre eles: o Rui do maciço, Ruy da maricultura, Vera da saúde, João Manoel do CCP Daniela, Helio, Domingos, Ivânio, Nivaldo e Ângela da UFECO, Marival do IFES, Marinho do SINERGIA, Denilson dos Bancários, Rô do Sintrasem, Gilmar da CASAN, Wolnei do Sintesp, Adriana do gab. Soares, Carmen da UDESC, Mané, Lino e Werner da UFSC…, sobre a urgência de debatermos a conjuntura municipal a luz das demandas e de um projeto de cidade voltado aos interesses dos movimentos sociais, popular e sindical, como expressão organizada das demandas, desejos e sonhos das maiorias de nossa população.

Seu texto, na rede do Fórum da Cidade, postado pela Carmen Susi e estas minhas inquietações levou a pautar na última reunião da Plenária do Fórum da Cidade uma conversa inicial sobre conjuntura. Nada ficou decidido, exceto a urgência e importância deste debate, e para isso ficamos de ver a possibilidade de se fazer um texto que sirva de convocatória para um Bate-papo da Conjuntura, entre os atores dos Movimentos Populares, lideranças e lutadores permanentes da resistência contra os desmandos das novas e velhas oligarquias e seus representantes no legislativo, executivo e judiciário.

Penso, que este seja o momento de abrirmos este debate da conjuntura, entre nós e nossos pares orgânicos, legítimos da luta e na luta social, até porque a temporada de promessas de campanhas, mundos e fantasias, esta aberta e a mil. Aqui na região na Bacia do Itacorubi as candidaturas para prefeito agendam e estão realizando reuniões com as Associações e Centros Comunitários, na busca da cooptação para as suas campanhas, sem qualquer relação orgânica com a história de luta e resistência dos atores comunitários, e nem mesmo de forma objetiva com as pautas de nossos movimentos no dia a dia.

A cidade explode em contradições e enfrentamentos diretos e silenciosos contra a exclusão e segregação social, destruição da natureza, em defesa de condições digna de vida para todos, nas áreas de educação, moradia, saúde, saneamento, transporte coletivo e mobilidade, trabalho e renda, lazer, cultura e esporte, e mesmo assim as elites, com apoio da RBS e os jornalecos marrons da direita, vendem na maior cara de pau um ideal de cidade, com debates, pautas e promessas vazias de campanha, que não falam das questões estruturais e ações concretas para o enfrentamento da exclusão e exploração imposta pelas elites, que faz de mercadoria as nossas vidas e nossos necessidades básicas, as infra-estruturas e equipamentos urbanos, a paisagem, o meio ambientes e nossos recursos naturais, a favor do lucro e vida fácil para menos de 10% das famílias da cidade.

Com a greve dos motoristas e cobradores, o prefeito, os vereadores e empresários em geral, deixaram claro suas intolerâncias com os movimentos de trabalhadores e populares, e que o transporte coletivo não é considerado, por eles, como um serviço essencial para a população, sem o qual nos é negado o direito à cidade e aos demais serviços essenciais. Cada centavo que entra nos serviços, programas e obras públicas é disputado pelo setor do capital privado, contra os objetivos e prioridades públicas e coletivas, que deveriam ter os recursos públicos.

Faz oito anos que terminou o contrato de concessão pública, para as atuais empresas operarem o transporte coletivo de Florianópolis, porém de forma criminosa contra o interesse público, os vereadores e prefeito corruptos, em comum com a banda podre do judiciário, não tiram esta teta das mãos da máfia do transporte coletivo, que controla as frotas, a COTISA (financiadas com recursos do BNDS/FGTS), e seus feudos territoriais da mobilidade, como se fossem fazendeiros/grileiros e nós seus rebanhos de abate a engordar suas contas bancárias e privilégios. Esta elite e classe política corrupta que ocupam função pública a serviço do capital privado, são os mesmos que não perdem a chance de perseguir e criminalizar nossos movimentos e lideranças, aqui novamente em conluio com a RBS e os jornalecos financiados pelo patronato e as oligarquias.

Todos sabemos, que a não realização de nova licitação no transporte, é a garantia de financiamento e caixa 2, nas campanhas a cada dois anos, para vereadores, prefeitos e deputados, e nos seus mandatos. Mesmo que saia uma nova licitação, sob a batuta deles, novos rearranjos serão feitos no processo licitatório para que a atual máfia do transporte mantenha o controle do sistema. Isso está no DNA dos corruptos, por questão de sobrevivência política e credibilidade diante de seus financiadores, alem do que, qualquer sistema de transporte coletivo, que seja mercantilizado e vise lucro, não pode atender aos interesses do usuário, que sempre buscará, como financiador, o custo zero do sistema. Só aqui neste item, do transporte e da mobilidade urbana, teríamos motivos de sobra para fazer uma faxina estrutural na gestão deste serviço, na política e ética em nossa cidade e ainda muito mais na região metropolitana.

Se formos aprofundar isso, na questão do planejamento do uso e ocupação do solo, no desenvolvimento urbano, a cada grande obra aprovada e mudança de zoneamento, aí sim a coisa toma dimensões generalizada de banditismo, de quadrilheiros corruptos e corruptores, todos de colarinhos brancos e com lastro em todas as regiões da grande Florianópolis, e nas campanhas e/ou mandato de todos os vereadores e prefeitos.

Para esta elite tudo é mercadoria, que tem preço, dos políticos até as leis, nossas vidas e a cidade. Dos nossos direitos essenciais à vida, só não privatizaram ou mercantilizaram o ar que respiramos, porem mesmo assim pagamos muito caro com a baixa qualidade de nossa saúde, com problemas respiratórios devido à insalubridade das vias públicas, dos locais de trabalho e de nossas moradias, pois o acesso, a ocupação e uso do solo em nossas cidades, a qualidade do urbanismo, da arquitetura e das construções que eles impõem para a maioria da população, sem qualquer padrão de conforto, salubridade e sustentabilidade, destroem a natureza, a paisagem e por conseqüência inclusive o ar que respiramos.

Mas o problema maior, na disputa com as elites, reside no processo de cooptação de lideranças, de organizações sociais, movimentos e entidades e até partidos (setores até então aliados táticos e estratégicos na organização da contra-ordem na sociedade), que hoje abertamente anestesiam seus pares contra as mobilizações e enfrentamentos, sob o manto da governabilidade da sua política de viés único à serviço do assistencialismo para a inclusão social, sem mexer nas estruturas da exploração social, que reside na luta entre a função social pública e privada dos meios produtivos, das riquezas produzidas, dos recursos naturais e da propriedade.

Esta governabilidade, para se sustentar diante do poder econômico (dos representantes do capital financeiro especulativo, do agronegócio, dos setores de energia, automobilismo e imobiliário), joga todas as suas fichas no modelo de crescimento desenvolvimentista do Governo Federal, gestados nos pactos das rodadas de negociações com as federações da indústria, do comércio, dos serviços e do agronegócio, do sindicalismo de resultado do setor privado e público e seus fundos de pensão e do FGTS, que resultou no PAC e seus programas de infraestrutura, sem responsabilidade com o desenvolvimento sustentável, o atendimento as prioridades estabelecidas em Leis e nos Planos Setoriais das Políticas Públicas (debatidos com a sociedade), e muito menos com o controle social da gestão, fiscalização e execução das obras, serviços e recursos públicos, que resultam em obras superfaturadas e serviços de baixa-qualidade oriundos do PAC.

Nunca se teve tantos recursos, em nossos municípios e tão pouco relativo controle social e participação popular nas decisões de projetos e prioridades, diante do atual arcabouço jurídico existente, que é ignorado.

Nisso entra aqui o papel vergonhoso, que eles impõem aos Conselhos de Direitos, bandeira política polêmica dos movimentos urbanos, desde os anos 80 do século passado, que deveriam garantir participação popular e controle social, mas que só existem, quando existem, em caráter consultivo e mesmo assim, pela suas composições, são controlados pelos interesses do capital e governamental, e acabam servindo para legitimar corrupção e desvio de prioridade e função do recurso e da política pública.

Nesta esteira da negação do controle social e governamental democrático, as elites do poder, buscam desregulamentar e tirar das esferas da união, os instrumentos históricos de controle estratégicos e soberanos dos recursos naturais, como o Código Florestal e os Sistemas de Fiscalização e Licenciamentos, buscam dar autonomia a órgãos de Gestão, Controle e Planejamento da Economia, criam Agencias Reguladores sem controle social, organizações não-governamentais, para regular e fiscalizar serviços estratégicos de interesse público, que na sua maioria já estão privatizados ou sob controle de capital misto, na lógica de Menos Estado e Mais Mercado.

Estas e outras questões estruturais de governo e de poder, é que deveriam compor a pauta de debates destas eleições. Porém, quem, no campo partidário e das alianças apresentadas para estas eleições, de fato tem lastro político, orgânico e histórico, em todas as frentes de luta, para fazer esta disputa política contra as elites, organizando mentes e corações em defesa da cidade? Francamente, não vejo no horizonte eleitoral nada tão cristalino, pois isso requer que esta aliança já estivesse dada entre estes atores e os nossos processos de mobilizações e articulações, junto aos movimentos e lutas de nossa cidade no dia a dia.

Os partidos, quando muito, tem um ou outro militante atuando no movimento social, sem qualquer relação orgânica da vida, organização e estrutura do partido, com a pauta, a organização e mobilização social por nossos direitos sociais, pois, para eles, a luta popular, em especial, é penduricalho tático e a sindical, é só por salário e, ambas, espaço de cooptação de lideranças e de aparelhamento de entidades e estruturas para suas teses absolutas, e suas disputas estratégicas reformistas, por espaços nos governos e pela manutenção de sua governabilidade.

Neste cenário, com raríssimas exceções no campo partidário institucional, resta-nos o lastro e alicerce da militância e lideranças, popular e sindical, que se solidariza a cada instante de luta, disputando, lenta e continuamente, pela construção de uma nova ordem social, uma nova cidade, democrática e sustentável, na contra-hegemonia dos governos e do poder do capital privado. E estes não se enquadram num único partido ou aliança eleitoral existente, pois estão filiados ou não, apoiadores ou não de partidos e alianças. Mas como atores da resistência real e não virtual, são os mais legítimos e possíveis interlocutores (candidatos ou não ao legislativo ou executivo) de nossos sonhos, de uma cidade sem exclusão e segregação social, sustentável na dimensão cultural, social, econômica e ambiental, para nós e nossas futuras gerações.

Acho que em seu texto, você aponta para a busca de uma alternativa também eleitoral para o voto consciente de cada cidadão e eleitor, e me permito pensar que o primeiro passo, nesta direção, poderia ser reunir nosso povo de lutas e sonhos, num grande Bate-papo sobre a Conjuntura Municipal e as nossas possibilidades de colocar em debate, também nas eleições, as nossas demandas pela construção uma cidade democrática e sustentável, onde a qualidade de vida, de todos e do meio ambiente, seja a nossa meta no debate e disputa eleitoral, e para alem dele, em nosso dia a dia nas frentes de luta e espaços de nossas vidas, e não na ilusão e busca tão somente de inclusão social e/ou por um lugar ao sol “nas praias e paraíso do capital” e da governabilidade do que é ingovernável.

Sabemos que, em Florianópolis, muita coisa já produzimos nas nossas conferencias e congressos setoriais, dos movimentos sociais, sobre políticas públicas, participação popular e controle social, e perfil de cidade que queremos. Portanto temos algumas bases comuns, para construir uma plataforma mínima que nos mobilize, por transformações mais radicais em nossa cidade, inclusive nestas eleições, para não ficarmos a reboque dos sonhos das elites e de seus representantes partidários e alianças.

Até hoje, ainda não vimos reforma duradoura em sistema político, cultural, econômico e social, que se sustente sem transformações radicais (das estruturas de domínio de governo e de poder), do próprio sistema, visto que as forças instintivas das classes sociais dominantes, sempre relutarão, contra a nova ordem, por dentro da governabilidade dos novos governantes e de suas alianças e elite política. Isso a história da civilização, das lutas de classes e de organização das sociedades nos ensinam há séculos.

Foto: Praia de Moçambique por Tali Feld Gleiser.

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