Banco Mundial admite que manipulou informações para favorecer politicamente a direita no Chile

Passadas exatamente quatro semanas do segundo turno das eleições presidenciais chilenas, com o megaespeculador Sebastián Piñera eleito, eis que o economista chefe do Banco Mundial, o estadunidense Paul Romer, admitiu em entrevista ao The Wall Street Journal, publicada neste sábado (13/1) que houve medições “injustas e enganosas” realizadas pela instituição nos últimos anos, e que foram “potencialmente contaminadas pelas motivações políticas do pessoal do Banco Mundial”.

Romer reconhece que essas motivações podem ter afetado os informes relacionados a diferentes países, mas cita somente o Chile como exemplo: “quero me desculpar pessoalmente com o Chile e com qualquer outro país ao qual possamos ter transmitido uma impressão equivocada”, disse o economista.

Entre os dados manipulados, segundo a confissão de Romer, estão a do ranking de competitividade empresarial. Por exemplo, a atual presidenta Michelle Bachelet já havia governado o país durante os anos de 2006 e 2010, e nesse período a posição chilena nesta medição sofreu uma queda abrupta – do 25º lugar ao 57º. Curiosamente, Piñera também foi o seu sucessor depois daquele mandato, e foi presidente entre 2010 e 2013, período em que o Chile recuperou magicamente sua posição no mesmo ranking, retornando à 34ª posição, para voltar a sofrer quedas a partir de 2014, justamente quando Bachelet retornou ao Palácio de La Moneda.

Outro informe que está sendo questionado, e que foi bastante utilizado por Piñera na última campanha eleitoral foi um publicado no ano passado, que apontava um crescimento da pobreza no Chile. Além do pedido de desculpas a Bachelet e ao Chile, Romer assegurou que irá comandar pessoalmente um processo de mudança de metodologias nos informes realizados pela instituição, o qual deve envolver também uma revisão das informações publicadas nos últimos anos.

Autor é chileno e ex-Lehmann Brothers

O responsável pela manipulação dos dados sobre o Chile nos informes do Banco Mundial é um chileno, ligado à ultradireita em seu país e com passagem pelo banco símbolo da crise econômica mundial em 2008.

Se trata de Augusto López-Claros, um economista diretor do Departamento de Indicadores Globais e Análises do Banco Mundial, que era o responsável pelo informe Doing Business, que mede a competitividade empresarial – exatamente o que Romer afirmou na entrevista que foi manipulado.

Em sua página web pessoal (http://www.augustolopez-claros.net/), diz que ele é diretor do Programa de Competitividade Global no Foro Econômico Mundial de Genebra desde 2003, cargo que o torna responsável também pela edição do Global Competitiveness Report (reporte de competitividade global).

Antes de ser parte do Foro, López-Claros trabalhou no setor financeiro: foi diretor executivo e economista internacional superior em Londres do banco Lehman Brothers International, cargo que ocupou por 5 anos. A quebra dessa empresa em 2008 foi o estopim para a crise econômica mundial.

Entre os muitos livros publicados por López-Claros, vale ressaltar os dois mais recentes, que falam sobre corrupção: Removing Impediments to Sustainable Economic Development: The Case of Corruption (“Removendo Impedimentos para o Desenvolvimento Econômico Sustentável: o Caso da Corrupção”, de 2015) e The Moral Dimension of the Fight Against Corruption (“A Dimensão Moral da Luta Contra a Corrupção”, de 2017).

A matéria do The Wall Street Journal diz que Augusto López-Claros não respondeu às tentativas da reportagem do periódico de obter a sua versão dos fatos. No entanto, ele sim deu declarações ao jornal ultraconservador chile El Mercurio a respeito do tema.

Sem se referir a Paul Romer nem a suas declarações, o chileno defendeu as informações presentes nos rankings agora questionados e afirmou que a introdução de uma variante de gênero foi o que levou o Chile a cair bruscamente no ranking de competitividade: “a legislação chilena tem uma série de características que incorporam restrições contra as mulheres”. Contudo, ele não explica nem quais são essas restrições e como elas variaram magicamente através dos anos, porque o país recuperou sua posição no mesmo ranking especificamente durante o mandato de Piñera e voltou a cair, também especificamente, quando Bachelet retorna ao poder.

Repercussões no Chile

Por sua parte, a presidenta Michelle Bachelet solicitou também uma investigação mais profunda sobre o caso, para se precisar as motivações confessadas por Romer: “é muito preocupante o que aconteceu, porque além do impacto negativo para o Chile, essas alterações afetam a credibilidade de uma instituição que precisa da confiança da comunidade internacional”.

Opositora de Bachelet, porém à esquerda, a jornalista Beatriz Sánchez, candidata presidencial da Frente Ampla chilena – terceira colocada da última eleição –, foi bem mais enfática que a presidenta diretamente afetada pelos erros dos informes do Banco Mundial, e se referiu mais claramente a uma manipulação com o objetivo de influir política e eleitoralmente no Chile: “manipular cifras para infundir o medo às mudanças é inaceitável. Sabemos que não são simples `erros´, são operações contra a democracia”.

Por parte do Partido Comunista chileno, a principal manifestação foi do sociólogo Manuel Guerrero, filho do histórico dirigente homônimo assassinado pela ditadura de Pinochet, quem publicou nas redes sociais uma alusão aos escândalos envolvendo Donald Trump nos Estados Unidos: “a simples suspeita de intervenção da Rússia nas eleições estadunidenses causa um escândalo gigantesco, e está bem, mas então, o fato de que o Banco Mundial confessa que houve adulteração de informações com motivações políticas, e especificamente para prejudicar os governos de Michelle Bachet e favorecer o de Piñera, deveria ser considerado intervencionismo também”.

Fonte: Carta Maior.

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