As lições da Europa

Por Boaventura de Sousa Santos.

(Português/Español).

Mercados financeiros nunca vão recompensar os países pelos sacrifícios que fazem, pois isso alimenta os lucros do investimento especulativo.

A Europa está assombrada pelo fantasma da exaustão histórica. Depois de durante cinco séculos ter atribuído a si a missão de ensinar o mundo, parece ter pouco a ensinar e, o que é mais trágico, parece não ter capacidade para aprender com a experiência do mundo.

O cantinho europeu, apesar de ser cada vez menor no contexto mundial, não consegue compreender o mundo senão por meio de conceitos gerais e princípios universais e nem sequer se dá conta de que a sua própria fidelidade a eles é hoje uma miragem.

Partindo da ideia de que a compreensão do mundo é muito mais ampla que a compreensão europeia do mundo, as dificuldades que a Europa passa podem ser um campo de aprendizagem fértil para o mundo. Eis as principais lições.

Primeira lição: a ideia de que as crises são oportunidades é uma verdade ambígua, porque as oportunidades vão em direções opostas e são aproveitadas por quem melhor se prepara antes da crise.

A direita usou a crise para aplicar a “doutrina de choque” das privatizações e da destruição do Estado social (privatização da educação e da saúde). Não tinha conseguido fazê-lo por via democrática, mas foi preparando a opinião pública para a ideia de que não há alternativa ao senso comum neoliberal.

A esquerda, pelo contrário, deixou-se desarmar por esse senso comum, e por isso não pôde aproveitar a crise para mostrar o fracasso do neoliberalismo (tanto pela estagnação como pela injustiça) e propor uma alternativa pós-neoliberal.

O movimento ecológico, que era forte, deixou-se bloquear pelo slogan do crescimento, mesmo sabendo que esse crescimento é insustentável, perdendo, assim, a oportunidade que lhe foi dada pela reunião da Rio+20 do próximo ano.

Segunda lição: a liberalização do comércio é uma ilusão produtiva para os países mais desenvolvidos. Para ser justo, o comércio deve assentar-se em acordos regionais amplos, que incluam políticas industriais conjuntas e a busca de equilíbrios comerciais no interior da região.

A Alemanha, que tanto exporta para a Europa, deverá importar mais da Europa? Para isso ser possível é preciso uma política aduaneira e de preferências comerciais regionais, assim como uma refundação da Organização Mundial do Comércio.

Aliás, a OMC já hoje é um cadáver adiado, no sentido de começar a construir o modelo de cooperação internacional do futuro: acordos globais e regionais que, cada vez mais e sempre na medida do possível, façam com que os lugares de consumo coincidam com os lugares de produção.

Terceira lição: os mercados financeiros, dominados como estão pela especulação, nunca recompensarão os países pelos sacrifícios feitos, já que não reconhecer a suficiência destes é o que alimenta o lucro do investimento especulativo. Sem domar as dinâmicas especulativas, o desastre social ocorre tanto pela via da obediência como pela via da desobediência aos mercados.

Quarta lição: a democracia pode desaparecer gradualmente e sem ser por golpe de Estado. Vários países da Europa vivem uma situação de suspensão constitucional, um novo tipo de Estado de exceção que não visa perigosos terroristas, mas, sim, os cidadãos comuns, os seus salários e as suas pensões.

A substituição de Berlusconi (para a qual havia boas razões democráticas) foi decidida pelo Banco Central Europeu.

O estatuto dos Bancos Centrais, criado para torná-los independentes da política, acabou por tornar a política dependente deles.

A democracia, depois de parcialmente conquistada, pode ser gradualmente esventrada pela corrupção, pela mediocridade e pusilanimidade dos dirigentes e pela tecnocracia em representação do capital financeiro, a quem sempre serviu.

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Las lecciones de Europa

Por Boaventura de Sousa Santos.

uropa está aterrada por el fantasma del agotamiento histórico. Tras cinco siglos de haberse atribuido la misión de enseñar al mundo, parece tener poco que enseñar y, lo que aún es más trágico, parece no ser capaz de aprender de la experiencia del mundo. A pesar de ser cada vez más pequeño en el contexto mundial, el rincón europeo no consigue comprender el mundo si no es a través de conceptos generales y principios universales y ni si quiera se da cuenta de que su fidelidad a éstos hoy es un espejismo. Partiendo de la idea de que la comprensión del mundo excede en mucho la comprensión europea del mundo, las dificultades por las que pasa Europa pueden ser un fértil campo de aprendizaje para todo el mundo. He aquí las principales lecciones.

Primera lección: la idea de que las crisis constituyen oportunidades es una verdad ambigua porque las oportunidades van en direcciones opuestas y son aprovechadas por quienes se preparan mejor antes de la crisis.

La derecha ha usado la crisis para implementar la “doctrina del choque”, que implica las privatizaciones y la destrucción del Estado de bienestar (privatización de la educación y la salud). No había logrado hacerlo por la vía democrática, pero fue preparando a la opinión pública para asumir la idea de que no hay alternativa al sentido común neoliberal.

Por el contrario, la izquierda se ha dejado desarmar por este sentido común, razón por la que no ha podido aprovechar la crisis para mostrar el fracaso del neoliberalismo (tanto por el estancamiento como por la injusticia) y proponer una alternativa posneoliberal.

El movimiento ecologista, antes fuerte, ha quedado paralizado por la consigna del crecimiento, aun sabiendo que este crecimiento es insostenible y que así pierde la oportunidad brindada por la cumbre Río+20 [1] del año que viene.

Segunda lección: la liberalización del comercio es una ilusión productiva para los países más desarrollados. Para ser justo, el comercio debe basarse en amplios acuerdos regionales que incluyan políticas industriales conjuntas y la búsqueda de equilibrios comerciales dentro de la región.

¿No debería Alemania, que tanto exporta al resto de Europa, importar más del resto de Europa? Para que esto sea posible, es necesaria una política aduanera y de preferencias comerciales regionales, así como una refundación de la Organización Mundial del Comercio, hoy un cadáver aplazado [2], en el sentido de empezar a construir del modelo de cooperación internacional del futuro: acuerdos globales y regionales que, cada vez más y siempre en la medida de lo posible, hagan que los lugares de consumo coincidan con los lugares de producción.

Tercera lección: los mercados financieros, dominados como están por la especulación, nunca recompensarán a los países por los sacrificios hechos, pues la insuficiencia de estos sacrificios es lo que alimenta los beneficios de la inversión especulativa. Sin el control de las dinámicas especulativas, el desastre social se producirá de todos modos, tanto por la vía de la obediencia como de la desobediencia a los mercados.

Cuarta lección: la democracia puede desaparecer gradualmente y sin necesidad de un golpe de Estado. Varios países de Europa viven una situación de suspensión constitucional, un nuevo tipo de Estado de excepción que no tiene en el punto de mira a peligrosos terroristas, sino a los ciudadanos comunes, sus salarios y sus pensiones. La sustitución de Berlusconi (para la que había buenas razones democráticas) fue decidida por el Banco Central Europeo. El estatuto de los bancos centrales, creado para hacerlos independientes de la política, ha hecho que la política dependa de ellos. Una vez conquistada parcialmente, la democracia puede ser destripada por la corrupción, la mediocridad y pusilanimidad de los dirigentes, así como por la tecnocracia en representación del capital financiero al que siempre ha servido.

Notas

[1] Se refiere a la Conferencia de Naciones Unidas sobre Desarrollo Sostenible de junio de 2012 (N. T.)

[2] Alusión al verso del poema “Don Sebastián, rey de Portugal”, de Fernando Pessoa, que dice: ¿Sin locura qué es el hombre más que una bestia sana, cadáver aplazado que procrea?” (N. T.)

Traducido por Antoni Jesús Aguiló y revisado por Àlex Tarradellas.

 

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