As letras machistas e misóginas deste “artista” deveriam incomodar todo mundo

SAN JUAN, PUERTO RICO - NOVEMBER 19:  Maluma performs at Coliseo Jose M. Agrelot on November 19, 2016 in San Juan, Puerto Rico.  (Photo by GV Cruz/WireImage)
O colombiano Maluma em Porto Rico. Foto: GV Cruz/WireImage

Por Yolanda Domínguez.

“A primeira se desespera, fica louca se eu gozo fora. A segunda tem o segredo e me paga para meter fundo.” Não são frases de um filme pornográfico, mas a música ouvida por muitos jovens hoje em dia. Em dezembro o artista, Maluma, foi convidado pelo canal de TV espanhol Telecinco para representar os novos talentos musicais do país no programa La Voz (A Voz).

Maluma, cujas letras são ouvidas por toda parte, virou símbolo de masculinidade na Espanha contemporânea.

Um de seus trabalhos mais recentes, Cuatro Babys (Quatro Gatas), faz a justificativa da violência contra mulheres.

A canção as descreve como simples corpos intercambiáveis a serviço do desejo sexual irrestrito, ilimitado e incontrolável dos rapazes. Pode ser que entre a música e a pronúncia horrível do artista, a mensagem passe despercebida. Mas eu me dei a liberdade de analisar alguns dos versos que chamam a atenção.

Se você tiver estômago forte, fique à vontade para assistir a este vídeo. Aviso: à medida que o vídeo avança, pode provocar náuseas, vômito, desconforto generalizado e raiva.

“Estou apaixonado por quatro gatas. Elas sempre me dão o que eu quero. Fodem quando eu mando. Nenhuma delas me vem com ‘mas’.”

É mais um exemplo do “efeito Axe” que testemunhamos a vida inteira: a ideia de que só porque você é homem e estala os dedos, todas as mulheres vão cair a seus pés e arrancar as calcinhas.

“Duas são casadas. Uma é solteira. A outra é tipo maluca e se eu não telefono, ela se desespera.”

Aqui é apresentado o bando -o grupo de mulheres sem nome, descritas apenas em termos de seu status com relação a outros homens: solteiras ou casadas.

“A primeira se desespera, fica louca se eu gozo fora. A segunda tem o segredo e me paga para meter fundo. A terceira acaba com meu estresse, trepadas seguidas, sempre damos três. Na primeira eu faço a terra tremer para ela, mas ela quer com Maluma e comigo ao mesmo tempo.”

Aqui é o amigo de Maluma, outro homem muito macho, que descreve o que faz com cada uma das mulheres.

Evidentemente, ser homem é associado a fazer sexo com quanto mais mulheres, melhor, quanto mais vezes, melhor. Enquanto isso as mulheres são descritas como pessoas que querem que o homem as penetre, as engravide (ele entra em mais detalhes mais adiante), meta muito fundo…

Fica claro que ser “muito homem” também implica não ter a menor ideia sobre o prazer feminino.

“Você tem todas minhas contas de banco e o número do MasterCard. Você é minha mulher oficial.” “Todas querem trepar comigo em cima de notas de $100. … Você me faz andar de patins. Comprando no dia de São Valentim. Elas já me custaram mais que um relógio Ulysse Nardin.”

O homem é mostrado como o caçador do bando. O homem é aquele que ganha dinheiro e sustenta a mulher (ops, as mulheres). As mulheres, como não poderia deixar de ser, são ávidas e só querem tirar vantagem dele. Sim, isso é tudo muito moderno.

“Nenhuma delas se cansa de foder. A ruiva quando está bebendo é a que fica mais molhadinha. Ela se enfurece quando me liga e eu não quero transar. Brigamos, ela joga minhas roupas fora, e eu tenho que ligar para a linguaruda para ir buscar.”

Além de estarem disponíveis para fazer sexo (acho que essa parte já ficou clara), as mulheres são descritas como empregadas que pegam as roupas do chão e, por uma pequena gratificação, as lavam, passam e deixam dobradas sobre a cama. A coitada da “linguaruda” nem sequer nome tem.

“Nem sei com qual delas ficar, é que todas elas chupam muito bem.”

Nosso personagem enfrenta um conflito tremendo: com qual das garotas ficar? Todas o agradam sexualmente, e o que mais uma mulher tem a oferecer? É desnecessário dizer que as mulheres não têm escolha – elas aceitarão a decisão que ele tomar.

“Diferentes nacionalidades, mas quando transam, todas gritam igual. Ela quer que eu a leve a Medellin. Quer que eu trepe com ela em carros novos. E com as outras duas juntas na banheira.”

Vale recordar aqui a frase de um dos estupradores de San Fermin: “Ela estava gemendo, estava curtindo”. E depois, quando nos indagamos de onde vêm essas coisas… E, caso não gritemos o suficiente, podemos também fazer isso em duplas, juntas na banheira, uma em soprano e a outra em contralto.

A rede Telecinco escolheu esse artista para aconselhar profissionais de canto. Ele perpetua os valores que vinculam a masculinidade com aspirações que se resumem a dinheiro e sexo, nada mais.

Parece que um dos orientadores do programa, que também é muito macho, Melendi, não quis perder para Maluma e avisou o convidado: “Cuidado com quem você põe no palco da próxima vez”, aludindo a uma dança “perreo” (algo como o twerking) de Maluma com a ex de Melendi.

Deve ser porque, mesmo eles não estando mais juntos, a mulher continua a ser propriedade dele.

Me pergunto o que estava pensando a equipe do La Voz quando convidou Maluma para o programa. Me pergunto o que os concorrentes devem ter pensado quando foram orientados por ele. E me pergunto também o que vão pensar os espectadores.

Estão fazendo falta as vozes de homens que se manifestem sobre esse assunto. Você não fica de estômago virado quando ouve essas letras? Você se sente representado desse jeito? Não o apavora a ideia de que seus filhos vão crescer vendo esses exemplos?

Este artigo foi originalmente publicado pelo HuffPost US e traduzido do inglês.

Fonte: Brasil Post.

DEIXE UMA RESPOSTA

Please enter your comment!
Please enter your name here

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.