As feiras grátis argentinas

Por Kelly Cristina Spinelly.

Quem confia em frases feitas como ”tudo tem seu preço” e “quando a esmola é demais, o santo desconfia” fica de queixo caído nas gratiferias de Buenos Aires.  O nome explica bem: são feiras de rua onde tudo é de graça. Sim, incrédulos, de graça.  Não é pegadinha. Ninguém te pede para preencher nenhum cadastro, você não tem de ouvir papos chatos de vendedores ou participar daquelas promoções de shopping center estilo “leve 400 reais em compras para ganhar um guarda-chuva”.

E mais: não se exige nada em troca – a ideia é compartilhar sem comércio.  O lema das gratiferias é levar o que quiser (ou nada) e deixar o que quiser (ou nada).  Elas existem desde fevereiro de 2010, graças à boa ideia do argentino Ariel Rodríguez Bosio. Ele é adepto do veganismo, admirador das leis da natureza e contra a economia baseada em propriedade.  “A base dos problemas da nossa sociedade é a propriedade privada. A única riqueza real é a que se usa para compartilhar”, filosofa.

Ariel é o exemplo do modo de vida que defende. Desde 2010 vive com a menor quantidade de bens que pode e faz parte do freeganismo (movimento que recupera comida jogada no lixo em perfeito estado). Essa talvez seja a única restrição da gratiferia: quando alguém opta por doar comida, ele prefere que seja comida vegana, que não faz mal aos animais.  E, claro, objetos para doar também têm de estar limpos e em bom estado.

Com esse mínimo cumprido, a inicitiava está livre para ser copiada. Ariel manda por e-mail e-mail um passo a passo para quem quer se juntar com os amigos ou vizinhos e fazer sua própria gratifeira. Há muita gente que quer: as feiras grátis já se espalharam pela Argentina e por alguns países da América do Sul e da Europa. Aparecem de diversos tamanhos, envolvendo de 40 a 600 pessoas, mas sempre com a mesma proposta. Em Buenos Aires já há algumas que são fixas, aos domingos (na Preça Almagro, no primeiro de cada mês, no Parque Centenario, no segundo de cada mês, e no Parque Lezama, no terceiro de cada mês).

Nelas, se encontra um pouco de tudo. Além de objetos como brinquedos, roupas, livros etc., há quem ofereça cortes de cabelo, sessões de massagem ou projete filmes. “Sempre temos que contar, explicar o que fazemos, apesar de o pessoal de Buenos Aires já estar se acostumando mais. As pessoa nos começo reagem com desconfiança”, conta Ariel. “Mas depois entendem como funciona e adoram. Nós combatemos a especulação, o consumo excessivo e a ideia que nos impõe de escassez o tempo todo: há mais comida que gente faminta, há mais casas vazias que gente sem teto. Falta é aprendermos a dividir”.

As novas gratiferias que surgem, quando pedem, são divulgadas no Facebook oficial, que já tem mais de dez mil seguidores,  Muitos usam a rede social para pedir coisas que gostaria de ganhar – de portas a bicicletas – ou oferecem objetos para doação. Ganhou o apelido de “gratiferia virtual”. Há muitas outras páginas pipocando na rede com o mesmo intuito.

Pra quem pergunta se não é mais fácil doar as coisas de uma vez para instituições de caridade, Ariel responde que o assistencialismo não é libertador. “Queremos combater a a ilusão de escassez que é imposta. Há mais casas no mundo que gente sem teto, há mais comida que gente sem fome”, diz Ariel. “As grafiferias são o reflexo da busca da minha vida, uma forma de inserir mais amor entre as pessoas.”

Fonte: http://terramagazine.terra.com.br/

Foto: Dia da Terra numa gratifeira

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