Arde, queima, padece o Afeganistão africano

Por Pepe Escobar.

 Asia Times Online
http://www.atimes.com/atimes/Global_Economy/OA19Dj02.html

(De Londres). Não há quem não ame o rugido de um jato de combate Mirage 2000 francês, logo de manhã cedinho. Tem perfume delicioso de… café da manhã neocolonial ao molho Hollande. Perfeito “molho à areia movediça”.

Aparentemente, seria mamão com açúcar. No Mali vivem 15,8 milhões de pessoas – com PIB per capita de apenas US$1.000/ano e expectativa média de vida de 51 anos – num território duas vezes maior que o da França (que tem PIB per capita de $35 mil e subindo). Mas quase dois terços do território do Mali estão sob ocupação de islamistas de diferentes grupos pesadamente armados. Capítulo seguinte? Bombardeie, mon chou, bombardeie.

Assim sendo, sejam todos bem-vindos à mais nova guerra africana: jatos Mirage e helicópteros Gazelle franceses da base francesa no Chad, mais uma esquadrilha de Rafales que decolam da França, bombardeando sem parar muçulmanos jihadistas do mal no norte do Mali. Business is good. O presidente François Hollande da França passou a terça-feira em Abu Dhabi acertando a venda de 60 Rafales àquela país que é caso exemplar de democracia do Golfo, os Emirados Árabes Unidos (EAU).

O ex-frouxo Hollande – já hoje vivendo as delícias da nova imagem de “resoluto”, “determinado” & durão – alcançou pleno sucesso no negócio de venda dessas armas para bombardear/incinerar islamistas na savana e tentar dar cabo deles lá mesmo, antes que embarquem com passagem só de ida Bamako-Paris para bombardear-incinerar a Tour Eiffel.

Há soldados das Forças Especiais Francesas em operação em campo no Mali desde o início de 2012.

O Movimento para a Libertação de Azawad (NMLA) liderado pelos tuaregues, por um de seus líderes, diz-se agora “a postos para ajudar” a ex-potência colonial, apresentando-se como mais confiável como fonte de conhecimento e informações sobre o terreno e a cultura locais que as futuras forças de intervenção da CEDEAO (Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental).

Os jihadistas-salafistas no Mali arranjaram imensíssimo problema para eles mesmos: escolheram mal o campo de batalha. Estivessem eles na Síria, estariam recebendo quantidade infindável de armas, bases logísticas, um ‘observatório’ com sede em Londres, horas e horas de vídeos em YouTube e irrestrito apoio diplomático, gentilmente a eles ofertados pelos suspeitos de sempre – EUA, Grã-Bretanha, Turquia, as petromonarquias do Golfo e – oui, monsieur – a França, há muito tempo.

Mas optaram pelo Mali… o que lhes valeu imediata chuva de golpes do Conselho de Segurança da ONU, o qual – mais rápido que um selecionado de super-heróis Marvel – autorizou que a França se pusesse à frente da guerra contra eles (no Mali, não na Síria). Seus vizinhos da África Ocidental – parte do bloco regional ECOWAS (Economic Community Of West African States, Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental) – receberam um ultimato (no final de novembro) para comparecerem, trazendo um plano de guerra. Sendo ali a África, nada aconteceu – e os islamistas continuaram avançando até a semana passada, quando Paris, afinal, decidiu aplicar-lhes boa porção de molho Hollande.

Nem um estádio de futebol repleto dos melhores xamãs da África Ocidental conseguirão impor ordem sobre um bando disparatado – e terrivelmente empobrecido – de países, para organizar em curto prazo um exército de intervenção, ainda que a aventura seja totalmente paga pelo ocidente, exatamente como o exército liderado por Uganda que combate a rede al-Shabaab na Somália.

Para completar o quadro onde nada é fácil, os jihadistas-salafistas são imensamente ricos, cortesia da explosão do contrabando de cocaína da América do Sul via Mali para a Europa, além do tráfico de seres humanos. Segundo o escritório da ONU para Controle de Drogas, 60% de toda a cocaína que chega à Europa passa pelo Mali. Aos preços das ruas de Paris, são mais de 11 bilhões de dólares.

Turbulência à frente

O general Carter Ham, comandante do Comando Norte-americano, o Pentágono na África, AFRICOM, há meses vem alertando sobre crise gravíssima. Chamemos de profecia que se faz, ela mesma, acontecer. Mas o que está, de fato, acontecendo no que o New York Times arcaica e astutamente chama de aquelas “longas e turbulentas trilhas do Sahara”?[1]

Tudo começou com um golpe militar em março de 2012, apenas um mês antes das eleições presidenciais no Mali, que depôs o então presidente Amadou Toumani Toure. Os golpistas justificaram o golpe, dizendo que seria resposta a incompetência do governo que não dava combate aos tuaregues.

No comando do golpe apareceu um capitão Amadou Haya Sanogo, velho amigo íntimo do Pentágono; a intimidade incluiu quatro meses de um curso básico de treinamento, do qual Sanogo emergiu como oficial de infantaria, em Fort Benning, Georgia, em 2010. Sanogo foi criado, essencialmente, pelo AFRICOM, sob um esquema regional que incluía o programa Parceria do Contraterrorismo Tans-Sahara do Departamento de Estado com a Operação “Liberdade Duradoura” do Pentágono. Desnecessário dizer que em todo esse negócio de “liberdade”, o Mali entrava como “firme aliado” – e parceiro no contraterrorismo –, para combater (pelo menos em teoria) a Al-Qaeda no Maghreb Islâmico [al-Qaeda in the Islamic Maghreb (AQIM)].

Ao longo dos últimos anos, o jogo de Washington foi sendo elevado à categoria de uma das Belas Artes. Durante o segundo governo de George W Bush, as Forças Especiais estiveram muito ativas ao lado dos tuaregues e de argelianos. Durante o primeiro mandato de Obama, começaram a apoiar o governo do Mali contra os tuaregues.

Uma opinião pública desavisada passará os olhos pelos jornais de Rupert Murdoch – por exemplo, no The Times of London – e no que escreve um suposto correspondente da Defesa – que lá aparecerá pontificando à vontade sobre o Mali, sem jamais escrever uma palavra sobre a guerra do Mali ser a guerra da Líbia que volta, como chicote que chicoteia o lombo do chicoteador.

Muammar Gaddafi sempre apoiou o desejo de independência dos tuaregues; desde os anos 1960s, a agenda do NMLA sempre foi separar o Azawad (região no norte do Mali), do governo de Bamako.

Depois do golpe de março de 2012, o NMLA parecia estar no comando. Plantaram a própria bandeira em alguns poucos prédios do governo e, dia 5/4/2012, anunciaram a criação de um novo país tuaregue independente. A “comunidade internacional” os menosprezou e, poucos meses depois, o NMLA já havia sido completamente marginalizado para todas as finalidades práticas, mesmo em sua própria região, por três outros grupos – os três islamistas: Ansar ed-Dine (“Defensores da Fé”); o Movimento por Unidade e Jihad no Oeste da África [orig. Movement for Unity and Jihad in West Africa (MUJAO); e a al-Qaeda no Maghreb Islâmico [orig. al-Qaeda in the Islamic Maghreb (AQIM)].

Conheçam os jogadores

O NMLA é movimento tuaregue laico, criado em outubro de 2011. Prega que a separação do Azawad permitirá melhor integração – e desenvolvimento – para todos os povos da região. Os combatentes do núcleo duro são tuaregues, os quais Gaddafi cuidou de integrar ao seu exército. Mas há também rebeldes que não entregaram as armas depois da rebelião tuaregue de 2007-2008, e alguns desertaram do exército do Mali. Os que retornaram ao Mali depois de Gaddafi ter sido assassinado por ‘rebeldes’ da OTAN na Líbia, trouxeram muito armamento pesado. Parte considerável desse armamento pesado acabou, sim, em mãos dos próprios ‘rebeldes’ da OTAN – islamistas apoiados pelo ocidente.

A al-Qaeda no Maghreb (AQIM) é o ramo norte-africano da Al-Qaeda, que jura fidelidade ao “Doutor”, Ayman al-Zawahiri. Os dois principais líderes da AQIM são Abu Zaid e Mokhtar Belmokhtar [ver http://redecastorphoto.blogspot.com.br/2013/01/islamistas-do-mali-matam-3-e-fazem-41.html], ex-membros do grupo linha-duríssima de islamistas argelinos, os Salafistas Para Pregação e Combate [orig. Salafist for Predication and Combat (SGPC)]. Belmokhtar fez a jihad no Afeganistão nos anos 1980s.

Abu Zaid aparece como uma espécie de “Jerônimo” (codinome Osama bin Laden) do norte da África, sob a indispensável bandeira negra e uma Kalashnikov sempre bem à vista, ambas, nos vídeos pelos quais se manifesta. Mas o líder histórico é Belmokhtar. E o problema é, sim, Belmokhtar, conhecido pela inteligência francesa como “O Incapturável”; recentemente, Belmokhtar uniu-se ao Movimento por Unidade e Jihad no Oeste da África, MUJAO.

Os combatentes do MUJAO são todos ex-combatentes da Al-Qaeda no Maghreb Islâmico, AQIM. Em junho de 2012, o MUJAO expulsou o Movimento para a Libertação de Azawad (NMLA) e tomou a cidade de Gao – onde imediatamente passou a aplicar os piores aspectos da lei da Xaria. Essa semana, os Rafales franceses bombardearam várias vezes a base do MUJAO. Um dos porta-vozes do MUJAO ameaçou, com todas as formalidades necessárias, “em nome de Alá”, responder àqueles ataques com ataque contra “o coração da França”.[2]

E, para terminar, o grupo Ansar ed-Dine é grupo de tuaregues islamistas, organizado ano passado e comandado por Iyad ag Ghali, ex-comandante do NMLA, que se autoexilou na Líbia. Converteu-se ao salafismo por ação da pregação – ou inevitavelmente – de pregadores paquistaneses no norte da África; em seguida manteve longos contatos diretos com vários emires da al-Qaeda no Maghreb Islâmico, AQIM. Interessante observar que, em 2007, o presidente Toure do Mali, nomeou Ghali cônsul do Mali em Jeddah, Arábia Saudita. Foi depois devidamente expulso, em 2010, porque se aproximara demais de islamistas radicais.

Me arranje aí “um pouco mais de terrorismo”

Ninguém no ocidente se pergunta por que o golpe chefiado por Sanogo, amigo do Pentágono, terminou com quase 2/3 do território do Mali sob controle de islamistas que impuseram a Xaria mais linha duríssima em Azawad – especialmente em Gao, Timbuktu e Kidal, um catálogo macabro de execuções sumárias, amputações, apedrejamentos e destruição dos santuários em Timbuktu. Como é possível que a mais recente rebelião dos tuaregues tenha sido sequestrada por umas poucas centenas de islamistas linha super dura? E nem adianta perguntar aos drones dos EUA, que são mudos.

A retórica oficial do governo (“liderar pela retaguarda”) de Obama 2.0 sobre o tema soa, de fato, como delírio futurista: o bombardeio pelos franceses poderia “mobilizar jihadistas” em todo o mundo e levar a – e queriam que levasse a quê?! – ataques no ocidente.[3] Mais uma vez, a velha boa Guerra Global ao Terror [orig. Global War on Terror (GWOT)] é a serpente que morde o próprio rabo.

Não há como entender o Mali, sem examinar o que está acontecendo na Argélia. O jornal argelino El Khabar arranha só a superfície dos fatos, observando que “ao recusar-se categoricamente a uma intervenção – e dizer ao povo da região que seria perigoso”, Argel “abriu os céus da Argélia aos Mirages franceses”.

A secretária de Estado Hillary Clinton esteve em Argel em outubro passado, para organizar uma espécie de arremedo de exército ocidental-africano de intervenção. Hollande esteve em Argel em dezembro. Oh yes, oui-oui, a coisa esquentou mês a mês por ali!

Voltemos pois ao professor Jeremy Keenan, da Escola de Estudos Orientais e Africanos [orig. School of Oriental and African Studies (SOAS)] da Universidade de Londres, e autor de The Dark Sahara (Pluto Press, 2009) e de The Dying Sahara (Pluto Press, 2013).

Em artigo publicado na edição de janeiro de New African, Keenan escreve:

“A Líbia foi fator catalisador da rebelião Azawad, não alguma causa subjacente. De fato, a catástrofe que se vê em curso no Mali é o resultado inevitável do modo como a Guerra Global ao Terror foi introduzida no Sahara-Sahel pelos EUA, mancomunados com agentes da inteligência da Argélia, desde 2002.”

Em síntese, Bush e o regime argelino, ambos, estavam carentes, como Keenan diz, de “um pouco mais de terrorismo” na Região. Argel precisava disso como meio para obter armas de melhor tecnologia. E Bush – ou os neoconservadores por trás dele – precisavam também disso para criar o front sahariano da Guerra Global ao Terror, com a militarização da África como principal estratégia para controlar mais recursos energéticos, sobretudo o petróleo, pensando em, assim, derrotar os massivos investimentos chineses. Essa é a lógica subjacente que levou à criação do AFRICOM em 2008.

A inteligência argelina, Washington e os europeus usaram aplicadamente a al-Qaeda no Maghreb Islâmico (AQIM), infiltrando-se na liderança do grupo, para dali extrair “mais terrorismo”. Enquanto isso, a inteligência da Argélia ia configurando os tuaregues como “terroristas” – o pretexto perfeito para criar a Iniciativa de Contraterrorismo Trans-Sahariana de Bush, e a “Operação Flintlock”[4] do Pentágono – manobras militares trans-Sahara.

Os tuaregues sempre assustaram muito o povo da Argélia, que não conseguiam nem imaginar o sucesso de um movimento nacionalista no norte do Mali. Afinal, a Argélia sempre viu toda a região como seu quintal.

Os tuaregues – população nativa do Sahara Central e do Sahel – são 3 milhões. Mais de 800 mil vivem no Mali, menos no Niger, com pequenas concentrações na Argélia, em Burkina Faso e na Líbia. Houve nada menos de cinco rebeliões tuaregues no Mali desde a independência em 1960, três outras no Niger e muita turbulência na Argélia.

A análise de Keenan é absolutamente correta ao identificar o que aconteceu ao longo de 2012, com os argelinos meticulosamente destruindo a credibilidade e o impulso político do NMLA. Sigam o dinheiro: ambos, Iyad ag Ghaly do grupo Ansar ed-Dine e  Sultan Ould Badi do MUJAO, são muito íntimos da agência de inteligência argelina, o DRS. Os dois grupos, de início, eram grupos bem pequenos.

De repente, chegou um tsunami de combatentes da al-Qaeda no Maghreb Islâmico. Essa é a única explicação de por que os tuaregues do NMLA foram, em apenas poucos meses, neutralizados politicamente e militarmente, em seu próprio território.

Reúnam os combatentes da liberdade de sempre

A posição de Washington, liderando “pela retaguarda” aparece ilustrada nessa conferência de imprensa no departamento de Estado, em que fala Susan E. Rice, embaixadora dos EUA à ONU (em http://usun.state.gov/briefing/statements/202714.htm). Em resumo, o governo do Mali em Bamako pediu que os franceses chegassem e baixassem o porrete. E assim foi feito.

Não. Não foi bem assim. Quem supuser que “bombardeie a al-Qaeda” é o que estaria acontecendo no Mali, vive no mundo de Oz. Para começar, usar terroristas islâmicos para sufocar movimentos indígenas de independência é ‘tática’ que consta de todos os manuais históricos da CIA/Pentágono.

Além do mais, o Mali é crucialmente importante na visão que o AFRICOM e o Pentágono têm para todo o MENA (Middle East-Northern Africa/Oriente Médio-Norte da África). Meses antes do 11/9, tive o privilégio de atravessar o Mali por estrada – e pelo rio Niger – e andei por lá, especialmente em Mopti e Timbuktu, com os deslumbrantes tuaregues, que me ofereceram um curso intensivo sobre o noroeste da África. Vi os pregadores wahhabi e pregadores paquistaneses por toda parte. Vi os tuaregues sendo expelidos passo a passo. Vi um Afeganistão em produção. E não era difícil seguir o dinheiro, enquanto bebericava chá no Sahara. O Mali tem fronteiras com a Argélia, a Mauritânia, Burkina Faso, Senegal, Costa do Marfim e Guiné. O espetacular delta interno do Niger fica no Mali central – ali, ao sul do Sahara. Mali jorra ouro, urânio, bauxita, ferro, manganês, estanho e cobre. E – o Oleogasodutostão passa por ali! – há muito petróleo não explorado no norte do Mali.

Já em fevereiro de 2008, o vice-almirante Robert T Moeller dizia que a missão do AFRICOM era proteger “o fluxo de recursos naturais da África para o mercado global”; sim, e fez a conexão crucial rumo à China: estaria “desafiando interesses dos EUA”.

Aviões-espiões do AFRICOM “observaram” o Mali, a Mauritânia e o Sahara durante meses, em tese à procura de terroristas da AQIM; a coisa toda foi supervisionada pelas Forças Especiais dos EUA, parte da Operação Creek Sand[5], secreta, com base no vizinho Burkina Faso. Esqueçam: não se vê ali ninguém fardado: todos são – e o que mais seriam? – empresas privadas contratadas para espionar e não usam uniforme.

Mês passado, na Brown University, o general Carter Ham, comandante do AFRICOM, deu mais um forte empurrão na “missão de fazer avançar interesses de segurança dos EUA em toda a África”. Agora se trata – com atualizações – da Estratégia Nacional dos EUA na África, assinada por Obama em junho de 2012. Os objetivos (convenientemente muito vagos) dessa estratégia são “reforçar instituições democráticas”; estimular “o crescimento econômico, comércio e investimentos”; “promover a paz e a segurança”; e “promover oportunidades e desenvolvimento.”

Na prática, é a militarização à moda ocidental (com Washington “liderando pela retaguarda”) versus o sempre ativo movimento de sedução/investimentos chineses orientado para a África. No Mali, o cenário ideal para Washington seria um remix do Sudão: exatamente como a recente divisão em Sudão do Norte e Sudão do Sul, o que criou dor de cabeça estratégica extra para Pequim. Por que não dividir o Mali ao meio, para melhor explorar suas riquezas naturais? Não esqueçam: até a independência em 1960, o Mali chamava-se Sudão Ocidental.

Já no início de dezembro o Pentágono trabalhava sobre o ‘conceito’ de uma guerra “multinacional” no Mali.

A beleza do negócio todo é que, embora com exército multinacional ‘por procuração’, financiado pelo ocidente, apoiado pelo Pentágono, já entrando em ação ‘no terreno’, são os franceses os encarregados de regar a terra, no Mali, com o letal molho Hollandês (nada como uma ex-colônia “em convulsão” para fazer babar os ex-colonizadores). O Pentágono sempre pode continuar usando seus discretos aviões-espiões P-3 e os drones-espiões Global Hawk que têm base na Europa, e adiante, para transportar tropas da África Ocidental e dar-lhes cobertura aérea. Mas secreto, tudo secreto, super super sigiloso.

Mr. Inferno Geral já levantou a cabeçorra, em tempo recorde, mesmo antes de os 1.400 (e aumentando) coturnos franceses entrarem em modo de ofensiva.

Um comando do MUJAO (não da al-Qaeda no Maghreb Islâmica, AQIM, como foi noticiado), comandado pelo – e quem mais seria? – “incapturável” Belmokhtar, invadiu um campo de gás no meio do deserto do Sahara argelino, a mais de 1.000 km ao sul de Argel, mas a apenas 100 km da fronteira líbia, onde prenderam e fizeram reféns muitos ocidentais (e alguns japoneses); operação de resgate lançada na 4ª-feira pelas Forças Especiais da Argélia foi – para dizer o mínimo – uma gigantesca confusão, da qual resultaram (já confirmados até agora) pelo menos sete reféns estrangeiros e 23 argelinos mortos.

O campo de gás está sendo explorado pela British Petroleum, pela Statoil e pela Sonatrach. O MUJAO denunciou – e o que mais denunciariam? – a nova “Cruzada” francesa e o fato de que os jatos de guerra franceses são, hoje, donos do espaço aéreo da Argélia.

No que tenha a ver com a volta do chicote no lombo do chicoteador, só vimos, até agora, os hors d’oeuvres. E não ficará confinado ao Mali. Convulsionará a Argélia, em breve o Niger – fonte de mais de um terço do urânio que faz funcionar as usinas nucleares francesas e todo o Sahara-Sahel.

Assim sendo, esse novo, que mal começa a ser cevado, mega-Afeganistão na África será bom para os interesses neocoloniais franceses (por mais que Hollande repita que só se interessa por “paz”); será bom para o AFRICOM; dará grande impulso aos “Jihadistas Antes Conhecidos como Rebeldes da OTAN”; e será com certeza ótimo para a infinita Guerra Global ao Terror, devidamente rebatizada como “operações militares cinéticas”.

Django, liberto de suas cadeias, estará totalmente em casa. E o Oscar de Melhor Canção vai para o continuum Bush-Obama: Não há negócio como o negócio do terror. Legendado em francês, bien sur.

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Para ouvir ao som de “Umbabarauma. Ponta de lança africano” ( Jorge Benjor e Mano Brown)
http://letras.mus.br/jorge-ben-jor/1805943/

Sobre os tuaregues, o Brasil só sabe o que aprendeu de Jorge Benjor.
Mas, não se sabe por quê, não se encontra gravação de Jorge Benjor em Youtube.
Então, vale a (maravilhosa) gravação de Gal Gosta
(http://www.vagalume.com.br/gal-costa/tuareg.html) [NTs]

(Contribuição dos commons da Vila Vudu,
acrescentada pelos tradutores, por sua conta e risco. A luta continua.)


[1] 13/1/2013, em http://www.nytimes.com/2013/01/14/world/africa/french-jets-strike-deep-inside-islamist-held-mali.html?_r=0

[2] 14/1/2013, Mali, em http://leaksource.wordpress.com/2013/01/14/mujao-threatens-retaliation-following-france-invasion-of-mali/

[3] A matéria, já citada, do NYT leva o título-arapuca de “French Strikes in Mali Supplant Caution of U.S.” [ataques franceses no Mali desconsideram (e/ou suplantam e/ou derrubam, derrotam) a cautela norte-americana] [NTs].

[4] Flintlock designa uma pequena pedra de sílex (sílex pirômaco), que, atritada, “gera faíscas a 3.000° C, tornando fácil construir fogo em qualquer clima, em qualquer altura, até mesmo sob tempestades e neve” (http://www.dicionarioinformal.com.br/significado/pederneira/2929/). Era o mecanismo disparador de um tipo antigo de arma de fogo, a pederneira. O sílex, como se sabe, é usado desde a Idade da Pedra, para fazer pontas afiadas de flexas e machados. Muitas armas de sílex, pré-históricas continuam até hoje a ser encontradas na África, datadas do Paleolítico (“Idade da Pedra Lascada”). O nome escolhido para essa operação pela qual os EUA planejaram levar guerra à África é, bem traduzido e explicado, uma confissão de culpa; é manifestação linguística, também, da mais detestável arrogância racista eurocêntrica à moda Washington [NTs].

[5] Sobre isso ver http://www.globalsecurity.org/intell/systems/creek-sand.htm [NTs].

Imagem tomada de: bloomberg.com

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