A luta não pode continuar sendo só dos indígenas, diz Sonia Guajajara

“A vida no planeta depende do nosso modo de vida”, disse a líder indígena em live com grandes artistas do Brasil e do mundo para denunciar o genocídio

Garimpo ilegal em terra indígena é um dos fatores que colocam esses povos em risco de extinção. Foto Arquivo/Ibama

Os indígenas do Brasil pedem socorro. E não é só por causa do novo coronavírus, que já infectou mais de 23.453 deles, com mortos passando dos 650. “Há tentativas de legalizar esse entreguismo dos nossos territórios, de legalizar a exploração, o garimpo, de levar a mineração que já segue matando milhares de pessoas e o desmatamento, que atinge todos os biomas brasileiros”, disse Sonia Guajajara. Ela participou, neste domingo (9) de uma live especial, em que artistas de renome e cientistas do Brasil e do exterior se juntaram para denunciar o genocídio indígena sob o governo de Jair Bolsonaro. Muito além de um debate on-line, o programa, roteirizado pela cineasta Bia Lessa, mesclou também show e documentário.

Coordenadora da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), Sonia conclamou a sociedade a juntar à causa. “Essa luta não pode continuar sendo só nossa. Essa luta em defesa da mãe Terra precisa ser fortalecida. Fazemos esse chamado mundial não só em defesa dos nossos territórios, das nossas vidas. Mas para a compreensão de que a vida no planeta depende do nosso modo de vida”, disse. Segundo afirmou, embora os povos indígenas correspondam a 5% da população mundial, são capazes de proteger 82% da biodiversidade do mundo”.

“Reconhecer os povos indígenas e a importância da demarcação dos territórios é reconhecer essa causa como uma causa sua também. Pensar na água, no ar que você respira, que vale toda essa luta política que a gente faz lá no nosso território e que pagamos muitas vezes com a nossa própria vida. Os povos indígenas do Brasil convocam o mundo inteiro para apoiar uma luta que é sua também. A luta pela mãe Terra é a luta de todas as lutas”.

Vidas indígenas importam

É preciso e urgente, continua, exigir que o governo respeite os territórios e o modo de vida dessas populações. E, sobretudo, respeite a Constituição. “O agronegócio, a mineração, a indústria madeireira, a grilagem, não podem ser maiores que as nossas vidas. Não podemos permitir a perda de vidas pela falta de responsabilidade deste governo. Vidas indígenas importam. E é por isso que estamos aqui, com esse ‘movimento pandêmico’ colaborativo. Esse manifesto foi construído a muitas mãos. É um coletivo grandioso de pessoas que se dispuseram a estar junto com a gente, porque muita gente está entendendo que nós estamos em um estado de emergência”.

O ator Wagner Moura esteve entre os cerca de uma centena de artistas representados. “Até quando a sociedade vai ser conivente com essa violência? Até quando essa violência não vai mexer com a sua sensibilidade? Até quando você será conivente com essa matança? Nós estamos aqui para dizer que nós somos a resistência. Lutamos por nossas vidas, lutamos pelo meio ambiente. O meio ambiente está sendo brutalmente atacado”, disse, reproduzindo fala de liderança indígena.

Garimpeiros

A atriz Sonia Braga leu trecho do livro A Queda do Céu – Palavras de um Xamã Yanomami, de Davi Kopenawa. “Então meu peito começou a se encher de raiva e angústia, ao vê-los devastar as nascentes dos rios com voracidade de cães famintos. Tudo isso para encontrar ouro para outros brancos, com ele fazer dentes e enfeites ou só para esconder em suas casas”.

“Naquela época”, prosseguiu, “eu tinha acabado de aprender a defender os limites de nossa floresta. Ainda não estava acostumado à ideia de que precisava, também, defender suas árvores, seus animais, seus cursos d’água, seus peixes. Mas entendi logo que os garimpeiros eram verdadeiros comedores de terra e que iam devastar tudo no floresta”.

Fundo do poço

Vice-diretor do Instituto do Cérebro da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), o neurocientista Sidarta Ribeiro disse que o Brasil está no fundo do poço. “O Estado foi tomado por inimigos do povo, cujo projeto é desmantelar o próprio Estado em benefício de poucos. A educação, a saúde, o meio ambiente, a cultura e a ciência correm risco de extinção”.

Sidarta alertou que indígenas e quilombolas, negras e negros, inclusive crianças, correm risco de extinção nas periferias de todo o país. “Nossos atuais governantes são os piores possíveis, pois combinam a perfeita incompetência técnica com a completa podridão moral. Bolsonaro faz jus aos psicopatas mais perigosos de nossa história escravista e genocida”, disse, citando Domingos Jorge Velho (1641-1705), notório caçador de índios e negros, e Garcia d’Ávila (1528-1609), maior latifundiário da Bahia na época e torturador compulsivo. “Para superar esse pesadelo precisamos buscar o axé de nossa melhor ancestralidade.”

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