“A gente acolheu o cachorro que estava na rua, correndo riscos. A pessoa achou que tínhamos roubado. E se eu não fosse negra”?

Reprodução Facebook.

Por Claudia Weinman, para Desacato. info.

Um casal parou em frente de casa, rua Marcílio Dias, próximo da MM Bebidas, em um carro branco, pediram se o cachorrinho que encontraram era nosso. Falamos que não, então, o casal seguiu aos arredores perguntando se alguém sabia do paradeiro do dono. O casal, que estaria de passagem, levou o cachorro até a casa de seus parentes, retornando logo depois, estacionaram em frente da nossa casa, pedindo se podiam deixar ali, pois teriam que seguir suas atividades. Acolhemos, pois, o cachorrinho estava abandonado na rua, correndo riscos de ser atropelado”.

O depoimento acima é de Isete Carmen Lourenço. Ela tem  47 anos, é professora, educadora popular e trabalha como artesã, também de Lizioni Fontoura de Freitas, 51 anos, administrador, trabalha como masseiro.  No domingo, dia primeiro de novembro, período que dá início ao mês da Consciência Negra, lembra Isete,  pediram ajuda ao Portal Desacato. Era 14h49 quando Isete encaminhou um áudio via WhatsApp, pedindo se o Portal poderia publicar a foto de um cachorro na tentativa de ampliar a informação para localizar o dono. A postagem foi feita na página do Facebook do Portal e também, no perfil de Isete, onde outras pessoas também compartilharam a publicação, conforme consta nas imagens a seguir:

Foto: Reprodução Facebook.

Isete conta que chegou a entrar em contato com a ONG da cidade, “Amigo Bicho” por meio de uma voluntária, que levou até sua residência ração, uma casinha e também uma coleira. “Tínhamos medo que ele fugisse, pois havíamos divulgado, seria ruim o dono chegar e não ter mais ele em casa. Então resolvemos prevenir a situação e proteger o animal, colocamos a coleira no início da noite somente, claro”, salientou Isete.

Em seguida Isete ouviu alguém bater palmas e foi até o portão para averiguar. “A pessoa nem disse ‘boa noite’, chegou gritando ‘esse cachorro é meu, é meu’. Eu logo pedi que ele me desse alguma referência do animal, pois a gente nunca sabe se é realmente o dono do cachorro ou é só alguém que viu na internet o que publicamos. O cara continuou dizendo ‘esse cachorro é meu, moça, você quer ver foto? Não precisava ter amarrado ele’! Nesse momento, peguei o cachorro no colo, tirei a coleira e quando meu esposo voltou para pegar o celular para fazer uma foto dele com o cachorro, ele saiu rápido, quase correndo. A impressão é de que a gente iria assaltar ele, como se tivéssemos roubado o cachorro, sabe. Isso mexeu demais com a gente”, contextualizou.

Consciência Negra

Isete destacou que no primeiro dia do mês da Consciência Negra, a percepção é de uma sociedade caracterizada por ela, como “doente”. “Essas coisas mexem demais comigo. Ele podia ter pelo menos agradecido, como se faz entre pessoas, seres humanos. Muitas vezes fico me perguntando: ‘E se eu não fosse negra? Se eu morasse em uma mansão? Se eu, se eu, se eu’. Para alguns, isso é vitimismo, mas eu gostaria de compreender o porquê não somos respeitados”?

A artesã e educadora popular lembrou ainda os mais de três séculos de escravidão no Brasil e a importância de compreender a luta de Zumbi e Dandara dos Palmares e, além disso, enfatizou a necessidade de a sociedade estudar e romper com o racismo, a exploração. “Vivemos em uma sociedade que não pode ver as pessoas livres e felizes, ainda mais se essas pessoas são negras. O fato que ocorreu conosco, quando tivemos a intenção de ajudar um cachorrinho perdido no meio da rua, de não receber nem ‘obrigado’, conota uma sociedade, mal-intencionada, sem compaixão”.

Ela continuou: “Ao olhar para mim, meu esposo, não tem como medir nosso salário, mas tem como olhar e ver a cor da nossa pele. Não gostaria de parar de fazer o bem por conta desses seres humanos que estão em falta com a humanidade. São Miguel do Oeste, por favor, chega de hipocrisia, vamos aprender a ter respeito com o próximo/a. Sinceramente, deixo aqui meu agradecimento a quem compartilhou o pedido de ajuda para localizarmos o dono e também, principalmente, quem esteve junto no momento de indignação. Eu estou muito indignada. Não costumo me manifestar nas redes sociais sobre essas situações, mas agora, chega! Não vou mais deixar passar esse tipo de atitude”.

Racismo é crime

Racismo é crime, previsto na Lei nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989, a qual, “Define os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor”. Para saber mais sobre a lei, consulte: https://www.planalto.gov.br/.

 

 

 

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