“A comunidade me expôs essa necessidade, eu aceitei”, diz pataxó formado em medicina

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Por Juliana Gonçalves.

Recém-formado em medicina pela UFMG, Vazigton Guedes deseja retribuir os aprendizados da profissão à sua comunidade

 No último sábado (24), Amaynara Silva Souza e Vazigton Guedes Oliveira, ambos de 27 anos, participaram da cerimônia de formatura do curso de medicina da Universidade Federal de Minas Gerias.

Com cocar com longas penas coloridas e as pinturas étnicas no rosto, elementos comuns entre os indígenas pataxós em momentos festivos, Amaynara e Vazigton receberam seu diploma.

Ambos percorreram um longo caminho para cursar medicina na capital mineira. Ela veio das terras indígenas de Carmésia, no Vale do Rio de Doce mineiro, e ele de Cumuruxatiba, no Sul da Bahia, para se juntarem à turma com 130 alunos.

Eles entraram para o curso por meio de um programa da universidade federal que integra as ações afirmativas para indígenas, assim como as cotas e a formação de educadores indígenas, abrindo vagas adicionais a integrantes

Vazigton, mais conhecido como Zig, conversou com o Saúde Popular sobre como resolveu atender a um pedido da sua aldeia e cursar medicina, sobre o currículo na universidade e planos para o futuro.

Saúde Popular – Como surgiu a vontade de cursar medicina?

Zig – A vontade de fazer Medicina surgiu principalmente da necessidade de termos em nossa comunidade um médico fixo (normalmente de grandes capitais), em decorrência da grande alternância dos profissionais, o que acarretava um não acompanhamento longitudinal e mantendo quase sempre o serviço no mesmo ponto. Além disso, a minha vontade de querer ajudar o meu povo e tentar melhorar ao máximo o serviço prestado. Assim, a comunidade me expôs essa necessidade que foi aceita por mim no período do projeto da UFMG.

Como percebia o acesso à saúde do seu povo, na sua cidade?

No que concerne às necessidades de serviços de saúde, a rotatividade médica é algo existente e que não sustenta de maneira adequada às necessidades, quando a comunidade depende da medicina não-tradicional.

Como você vê o conteúdo do curso de medicina que você fez?

Considerando uma Universidade Pública os pontos negativos seriam a inflexibilidade do conteúdo curricular (disciplinas obrigatórias), não nos dando abertura de realizar disciplinas obrigatórias em outras matérias de interesse, por exemplo na área de plantas medicinais na Faculdade de Farmácia – e que essas disciplinas não sejam eletivas. Dessa forma, na Universidade em si é um desafio unir os dois conhecimentos, mas não impossível quando se pensa que os dois conhecimentos não são excludentes e sim complementares – há lugar para os dois. De ponto positivo estão as disciplinas ambulatoriais, voltadas assim para o serviço do Programa de Saúde da Família (PSF) e aquelas que diretamente a ele estão ligadas.

Como funciona o programa que abriu essas vagas específicas para indígenas?

O nosso programa foi o de Criação Suplementar de Vagas, onde foram criadas duas novas vagas em cada curso dos seis (Medicina, Enfermagem, Ciências Biológicas, Ciências Sociais, Odontologia e Agronomia) oferecidos pela Universidade. É inegável o papel inovador e fundamental desse projeto, visto que sem ele provavelmente não teríamos a oportunidade de adentrar um curso superior como o de Medicina, por exemplo, pensando em nossa formação pública que ainda é defasada em muitos aspectos quando comparada com a escola particular, onde a maioria dos concorrentes mais fortes puderam estudar.

Quais são seus planos a partir de agora?

A priori tentar residência em Medicina da Família e Comunidade e posteriormente poder voltar a minha comunidade. Além disso, realizar outros cursos de atualização ou até mesmo outras residências que venham incrementar a qualidade do atendimento que quero prestar.

Fonte: Brasil de Fato.

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