A Câmara aprova projeto, mas não é plano diretor

Por Lino Peres.
Na primeira votação do projeto do Plano Diretor, concluída nesta quarta-feira, o nosso voto foi contrário. É possível afirmar que, do ponto de vista técnico, a Câmara de Vereadores aprovou não um Plano Diretor, e sim um zoneamento incompleto e fragmentado.
É incompleto porque faltaram informações fundamentais e estruturantes para um Plano Diretor. Os 13 mapas apresentados tinham cartografia insuficiente, sem definição exata, por exemplo, das áreas que podem ou não ser urbanizadas, áreas de risco ambiental, estágios de crescimento da vegetação, declividade, macro-drenagem, projeção de luz e sombra, mapeamento de pontos notáveis da paisagem, entre outros. Isso tudo é necessário porque este conhecimento é que dá subsídios imprescindíveis para que se possa planejar a cidade, evitar urbanização em áreas de risco, prevenir inundações e deslizamentos, proteger a paisagem da ilha e do entorno marinho e continental e evitar uma “arquitetura doente”, com edificações sem luz solar, sombreamento inadequado, sem controle acústico e com ventilação excessiva.
A prefeitura, além disso, não apresentou vários mapas que – alegou no projeto -, estarão em planos específicos futuros, como a das condicionantes ambientais, mapa de localização de serviços públicos e privados, de distribuição de investimentos públicos, macro-drenagem, diagnóstico da infra-estrutura de saneamento e viária para os próximos 20 anos, necessária ANTES da liberação de gabaritos (número de pavimentos), e plano metropolitano de mobilidade, diagnóstico das áreas públicas a serem destinadas a equipamentos coletivos e áreas de lazer. Esse levantamento teria que incluir as áreas da União, dentro de sua diretriz de destinação social e pública destes terrenos. Todos esses mapas deveriam ter sido feitos ANTES e estarem no projeto do Plano Diretor.
Falta de precisão
Essa falta de precisão gera uma cegueira em relação ao crescimento/desenvolvimento da cidade. A ausência de um Projeto de Desenvolvimento Urbano (PDU), para além do Plano Diretor, é gritante. Esse Projeto de Desenvolvimento Urbano está para além de um plano físico-territorial, que é vulgarmente entendido como Plano Diretor. O PDU diz como a cidade deve se desenvolver social, cultural, ambiental e economicamente. Ele deve  promover uma redistribuição mais adequada entre habitação, serviços, áreas públicas e infra-estrutura urbana, evitando que ambos se concentrem demais em uma região e outras fiquem descobertas.
O Plano aprovado no dia 27 é fragmentado, porque reflete e acolhe múltiplos interesses e elimina muitos outros. O problema é que isso ocorreu sem transparência, de forma açodada e sem visão integradora e compartilhada/coletiva da cidade. O pouco que se avançou na perspectiva de uma cidade sustentável ocorreu em função da resistência de distritos organizados e movimentos sociais e ambientalistas que, principalmente desde os anos 1990, se organizam para debater a cidade e como ela vai ficar daqui para a frente.
Essa fragmentação também ocorrerá, por exemplo, no distrito do Rio Vermelho. Ali há problemas como ruas estreitas e exageradamente longas, de até um quilômetro de extensão, sem ruas transversais e sem serviços locais. Há alagamentos em vários locais, a rodovia principal não tem acostamento e tampouco faixa para passeios ou ciclovias, é muito insegura e perigosa, e o distrito também não tem transição entre áreas de preservação e de urbanização. E como o dito Plano Diretor aprovado enfrenta isso?
Ele somente limita as edificações em dois pavimentos na maior parte da região, o que é importante para evitar o adensamento excessivo, mas falta um plano urbanístico para corrigir todos os problemas apontados e inverter, para o futuro, esse caminho extremo de precarização urbana e ambiental.
É nesse sentido que o nosso mandato tem insistentemente criticado a nomeação de ruas, pela Câmara de Vereadores, e não pelo Executivo, sem que antes a prefeitura faça um plano urbanístico sério.
Processo participativo em ruínas
A aprovação do Plano Diretor no dia 28 deixou em ruínas o que restou do processo participativo. Muitas votações de destaque se basearam em uma tabela malfeita do IPUF, sem a devida fundamentação para manter ou não emendas.
Agora haverá o retorno do projeto ao Executivo, que poderá fazer vetos totais ou parciais. Mas, como não houve autonomia dos vereadores para analisar o projeto a fundo e como as emendas já foram filtradas pelo IPUF/PMF, é provável que o Plano Diretor seja aprovado sem vetos, e a próxima sessão, dentro de um mês, seja novamente marcada pela prática de “rolo compressor”.
Ainda hoje vamos iniciar uma análise crítica para o mais rápido possível ter um quadro de como ficará a cidade, e expor ao Ministério Público tudo o que foi feito de irregular no processo.
Esclarecemos que nosso voto foi contrário porque, apesar de alguns avanços, como restrição de gabaritos em algumas regiões e a incorporação, à “cidade legal”, de assentamentos de populações empobrecidas (ainda que com problemas de infra-estrutura não resolvidos), é preciso considerar todos os aspectos acima levantados. O projeto não tem unidade conceitual, metodológica e técnica. Há uma ausência de implementação efetiva de instrumentos urbanísticos e de controle e participação social.
A prefeitura fez a população acreditar, com seus discursos veiculados na mídia, que o plano diretor vinha sendo discutido desde 2006. Genericamente, sim, mas de forma fragmentada e interrompida entre início de 2009 e final de 2011 e desde o final do primeiro semestre de 2012 até setembro passado. De fato, desde 2006, debatem-se três projetos, dois da administração Berger e agora um da administração atual, o qual FOI APRESENTADO SOMENTE EM SETEMBRO PASSADO. Portanto, ESSE projeto aprovado quarta foi conhecido e mal debatido dois meses e aprovado em dois dias. Mas a história da prefeitura convenientemente colou.
O fato é que o plano ainda vigente, de 1997, teria sido mais eficaz se houvesse efetiva fiscalização da prefeitura, com servidores contratados, equipamentos, monitoramento, relação com as comunidades, além de quadro técnico de planejamento estável e adequado no IPUF para essa função, porque o órgão, na administração anterior, foi sucateado. Sem isso, qualquer Plano Diretor, o de 97 e o que foi aprovado dia 28, não tem sequer os pequenos avanços garantidos.
Agradecemos as palavras de apoio e reconhecimento que temos recebido sobre o trabalho de divulgação da tramitação deste projeto. Em breve o mandato irá divulgar um estudo sobre como ficará a cidade a partir do que foi aprovado no dia 28 na Câmara de Vereadores.

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